Melhores Séries, Episódios e Atuações da TV na Temporada 2015/2016

Fargo, Veep, The Leftovers, BoJack Horseman, Jane the Virgin e Better Call Saul estão entre os destaques. 

Hollywood está fazendo mais séries do que qualquer ser humano pode assistir. Só em 2015, foram 409 programas roteirizados, desde produções de tevê aberta, a cabo e serviço de streaming. Mesmo sem haver seriados já considerados clássicos atualmente no ar, como Mad Men e Breaking Bad, a mais recente Era de Ouro da TV continua a todo vapor, oferecendo obras originais, baseadas em material já existente ou spin-offs de sucessos anteriores. Seja qual for sua origem, as produções televisivas se tornaram o principal passatempo de muita gente, assim como a principal escolha de trabalho de diretores, roteiristas, atores, entre outros profissionais devido às possibilidades que o formato permite para contar boas e diferentes histórias.

Em meio a um momento em que a oferta é maior do que a possibilidade de consumir, o Previamente mantém a tradição, pelo sexto ano, de selecionar a dedo quais foram os maiores destaques da temporada na tevê e facilitar a vida do espectador na hora de escolher sua próxima série. Contamos com 13 jurados, entre críticos, jornalistas, estudantes de Jornalismo e Cinema, e aficionados por séries. Para esta eleição, foi utilizado o mesmo critério do Emmy Awards: entraram as obras que foram exibidas em sua totalidade ou mais de 50% de sua temporada entre 1º de junho de 2015 e 31 de maio de 2016. Além disso, neste ano os leitores puderam eleger pela primeira vez quais foram as suas séries de comédia e de drama favoritos.

Enfim, sem mais enrolação, segue abaixo o nosso listão do que houve de melhor na TV na temporada 2015/2016.

Melhores Atores Coadjuvantes

Andre Braugher (Brooklyn Nine-Nine)

É uma ótima surpresa encontrar Andre Braugher em uma comédia tão agradável quanto Brooklyn Nine-Nine. Capitão da delegacia de polícia, Ray Holt é um personagem negro e gay nada estereotipado e, por isso, mais divertido de se assistir. Sua (falta de) expressão por si só já uma das mais engraçadas características nesse escritório, mas Andre Braugher ainda nos presenteia com uma atuação leve, carismática e diferente do resto do elenco.

Brooklyn Nine-Nine - Season 3

Alan Cumming (The Good Wife)

No decorrer da sétima temporada era normal encontrar fãs que acusassem a ótima The Good Wife de ter tornado-se The Alicia Florrick Show. Realmente, Alicia roubara praticamente todo o foco para si, com as tramas caminhando à sua volta e outros personagens sem espaço para desenvolvimento (sendo a Diane de Christine Baranski, notavelmente, a que mais sofreu com isso). Porém, Eli Gold, uma das figuras de maior presença dentro da série e fan favorite, acaba sendo a exceção. Num último ano relativamente dramático para o gerente de campanha, Eli tentou vingar-se de Peter; alimentou uma rivalidade com Ruth; precisou defender sua filha Marissa; envolveu-se num romance que não foi para a frente; e, para a surpresa de todos, finalmente revelou à protagonista sobre a mensagem apagada de Will lá na segunda temporada, em um momento raro de empatia. Nem sempre o roteiro acertava, mas Cumming trabalhava muito bem com o material que recebia, entregando novas nuances que outras temporadas não exploraram com o personagem até aquele momento. Dessa forma, Cumming era um dos poucos que conseguira tomar os holofotes da nossa querida Julianna Margulies, nem que fosse por pouco.

Alan Cumming (The Good Wife)

Jaime Camil (Jane the Virgin)

Jane the Virgin tem muitas qualidades, mas Rogelio de La Vega é sem dúvida uma das maiores. Jaime Camil faz o pai de Jane, um ator latino de telenovelas que, apesar de realmente manter uma fanbase impressionante e uma lista de amigos íntimos (diz ele) que inclui Britney Spears e Bruno Mars, vive perdido em seus próprios delírios de grandeza. Diferente de seu rival, Esteban Santiago, o Rogelio de Camil é amável e generoso, e seu narcisismo ajuda a torná-lo objeto de curiosidade, e não de desgosto. Apaixonado por seus papéis e seus fãs, a performance de Camil faz com que Tiago a Través del Tiempo, a novela de Rogelio, seja uma parte incrivelmente sedutora de Jane the Virgin, digna de um spin-off só dele. Rogelio é o tipo de celebridade esnobe que é fácil pintar como desprezível na trama principal, mas Jaime Camil o interpreta como um cara tão charmoso e envolvente que eu não ficaria surpresa se ele fosse o personagem mais amado da série, mais do que a própria Jane.

Jaime Camil (Jane the Virgin)

Christopher Eccleston (The Leftovers)

É difícil dizer qual personagem de The Leftovers tem a jornada mais dolorosa, porém Matt é um que não consegue deixar o passado pra trás, especialmente porque o resultado da “partida” é ter sua esposa, ao seu lado, em estado vegetativo. Neste segundo ano, o pastor tem sua fé rapidamente restaurada, e encontra a esperança. Apesar disso, o sofrimento continua a assolá-lo, passando por uma maré de azar em “No Room at the Inn”, um dos pontos altos da temporada. Disposto a se sacrificar por sua esposa, ele acaba se sacrificando por terceiros também. Nesta enxurrada de dor e situações impossíveis, Christopher Eccleston honra cada segundo que está em tela para entregar uma performance poderosa e emotiva.

Christopher Eccleston (The Leftovers)

Jonathan Banks (Better Call Saul)

Após ser roubado descaradamente no Emmy Awards do ano passado, Jonathan Banks continua provando merecer reconhecimento da Academia com sua atuação de Mike em Better Call Saul. A série vem servindo para mostrar novas facetas dos personagens originados em Breaking Bad e Mike se torna um dos três protagonistas do spin-off, ao lado de Jimmy e Kim. Banks imprime seu jeito durão, com olhar de poucos amigos, encobrindo seu lado emocional e protetor. Ainda que seus dramas pessoais tenham ganhado menos destaque, eles são o que guiam Mike e fazem com que ele esteja disposto a tudo – inclusive acabar com um cartel mexicano de drogas – só para que consiga dormir em paz sabendo que sua enteada e sua neta estão sãs e salvas. Seu coração pode ser grande, mas quando entra em ação ele é implacável.

Jonathan Banks (Better Call Saul)

David Tennant (Marvel’s Jessica Jones)

A televisão britânica neste início de século conseguiu consolidar a carreira de alguns grandes atores que hoje são conhecidos em grande medida por sua incrível e variada carreira nesse meio. Atores como Chris O’Dowd e Steve Coogan na comédia, James Nesbitt e Idris Elba no drama, são alguns dos nomes que ficaram conhecidos como grandes atores de televisão, o que na Era de Ouro da mesma, não se trata de nenhum demérito, ao contrário. Porém, dificilmente se irá lembrar de um ator com repertório tão variado e competente como David Tennant. De provavelmente o melhor Doctor Who desde o revival, passando por papéis de destaque em Spies of Warsaw, The Escape Artist e The Politician’s Husband, além do trabalho impecável em duas temporadas de Broadchurch. Agora em Marvel’s Jessica Jones, Tennant interpreta o vilão Killgrave, o “Homem Purpura” das HQs da “Casa das Ideias”. Para além de uma interpretação de um vilão com características caricatas e genéricas de um psicopatia (como é o mais comum na retratação dos nêmesis dos heróis) ou o vilão anti­-herói (outra tendência bastante presente), o ator acaba por buscar uma interpretação bem mais original do que esperado, respaldada na realidade, buscando mais referências em comportamentos cotidianos do que em estereótipos. O que tem sido uma tendência não somente no personagem, mas em ambas as séries que a Marvel realizou na Netflix. Apoiado em uma antagonista como Jessica Jones (Krysten Ritter), alguém que apenas quer ter uma vida não tão complicada como a de super-heroína,  Tennant constrói seu Killgrave como assediador psicológico bastante hábil, capaz de manipular as pessoas não somente com seus poderes, mas em situações de assédio e abuso reais, típicas de relacionamentos abusivos que muitos e muitas, infelizmente, encontram-­se sujeitos. Passando por vários momentos do assédio moral e psicológico, o personagem ainda faz uso de poderes adquiridos na infância de controle de mentes, fazendo dele, mesmo sem poderes relacionados a força ou que desafiam a gravidade, um vilão dos mais perigosos e provavelmente o mais desprezível das adaptações recentes de personagens dos quadrinhos para o audiovisual.

David Tennant (Marvel's Jessica Jones)

Melhores Atrizes Coadjuvantes

Carrie Coon (The Leftovers)

Mesmo quando a série estreou, ainda meio morna, Carrie Coon não fez feio. Se a primeira temporada foi abaixo das expectativas, não foi por causa de Nora. Mas o segundo ano de The Leftovers serviu para corroborar o quanto sua atuação se destaca. O personagem é intenso e o roteiro deu todo o material necessário para que ela entrasse para a nossa lista de melhores da temporada. Não imagino The Leftovers sem Carrie Coon e, em uma temporada magnífica como essa segunda, isso é o melhor elogio que alguém poderia receber.

Carrie Coon (The Leftovers)

Constance Zimmer (UnREAL)

Constance Zimmer é aquele clássico exemplo de excelente atriz que muito provavelmente fez aparições em grande parte das séries que você acompanha/acompanhou, mas sempre foi subaproveitada em papéis recorrentes ou terciários que não possuíam muito destaque. Entretanto, UnREAL finalmente apareceu para mudar isso. Constance dá a vida à complexa personagem Quinn King, uma obstinada e dedicada showrunner de um reality show sobre relacionamentos que busca o sucesso profissional a todo custo. Com críticas assustadoramente positivas para uma produção do Lifetime, Zimmer (assim como UnREAL em si) se mostra uma das maiores surpresas e revelações desta temporada. A personagem Quinn King, inclusive, garantiu a Constance a vitória de um Critics Choice Television Awards.

Constance Zimmer (UnREAL)

Ann Dowd (The Leftovers)

Patti já era magnífica e extremamente irritante enquanto não podia falar uma palavra durante boa parte da primeira temporada de The Leftovers. Nesta segunda temporada, contudo, a personagem teve outro propósito: incomodar Kevin e falar sem parar, como um fantasma preso num limbo próximo à testemunha que a viu tirar a própria vida. Ann Dowd mostra-se novamente perfeita para o papel, perturbando Kevin ao máximo, induzindo-o à insanidade e tirando-lhe a pouca paz que lhe restava. Seja com diálogos existenciais, balela de fantasma ignorado, sarcasmos (como o momento em que Patti diz que Kevin precisa encontrar um artefato raro no Egito e enchê-lo com seu próprio esperma e beber todo o conteúdo), melancolia e muito mistério, Dowd se entrega a cada cena, em uma performance de alto nível, possivelmente a sua melhor atuação da carreira até aqui.

Ann Dowd (The Leftovers)

Alison Wright (The Americans)

The Americans pode ser esquecida ano após ano nas principais premiações televisas, mas é inegável a força do programa. É a queridinha da crítica especializada. Alison Wright é uma boa representante do elenco, principalmente pela narrativa de Martha ter explodido na quarta temporada. Embora fosse a única fonte dos Jennings dentro do FBI, a personagem nunca foi o foco das atenções, nunca teve o próprio plot. Nisso a descoberta de Stan trouxe uma série de possibilidades para o roteiro, dando bom material para a atriz. Alison entregou atuações condizentes com a trajetória de Martha – uma mulher insegura que traiu a própria nação por amor. Não acredito que essa seja a última vez que a vemos. Sua presença abala a relação de Philip e Elizabeth e ainda pode ser usada.

Alison Wright (The Americans)

Rhea Seehorn (Better Call Saul)

Breaking Bad é uma das obras mais fantásticas que a televisão nos proporcionou nos últimos anos e isso pouca gente nega. Ainda assim, não é um programa desprovido de críticas e uma das maiores contra a série é a falta de personagens femininas fortes. Claro que BrBa nos apresentou Skyler White, que foi muito mais que uma simples dona de casa, entretanto, era praticamente isso. Em Better Call Saul, nós temos Kim Wexler, advogada que possui um relacionamento com Jimmy. Nessa segunda temporada, os roteiristas deixaram a personagem mais interessante, não servindo apenas como um compasso moral para Jimmy, mas também dando a chance para Rhea Seehorn mostrar em tela como sua personagem é uma mulher complexa com suas próprias atitudes e dúvidas. Kim andou em uma linha tênue entre o que é certo e o que é amoral, tentando manter-se honesta em seu trabalho e lidando com um namorado que tem dificuldade de respeitar autoridade e que utiliza de artimanhas para fazer o serviço. O destaque na atuação de Seehorn é como ela consegue mostrar o desgosto de sua personagem pelas ações de Jimmy e continuar carismática, atiçando empatia de quem assiste. Kim não soa como um obstáculo para o protagonista (como muitos viam Skyler para o Walter) e sim uma pessoa com sentimentos e que se importa com o que pode ocorrer. E se algo ruim acontecer, ela não torna-se uma donzela em perigo. Como a própria dispara contra Jimmy em uma das cenas mais antológicas dessa temporada: “You don’t save me. I save me.” Pra mim já é o suficiente para ousar dizer que Kim Wexler é a mulher mais incrível do universo de Breaking Bad até o momento.

Rhea Seehorn (Better Call Saul)

Regina King (The Leftovers)

Regina King foi responsável pela melhor cena da segunda temporada de The Leftovers. A conversa/questionário de Erika Murphy com Nora foi arrepiante e não deixou dúvidas de que as mulheres realmente têm condições de carregar esse drama nas costas. Intensa e misteriosa, a personagem estreante nesse ano foi um dos motivos dos elogios recebidos pela crítica. A carga dramática de seus diálogos foi um dos pontos altos em todos os episódios. Obrigada, HBO, por nos presentear com Regina King em um roteiro tão bom.

Regina King (The Leftovers)

Melhores Atores

Jeffrey Tambor (Transparent)

Jeffrey Tambor sabia que seria um desafio gigantesco quando aceitou viver Mort Pfefferman, que logo se assumiria para a família como Maura, uma mulher transgênero, em Transparent, série da Amazon. E Tambor mergulhou de cabeça na trajetória complexa da personagem, trabalho que foi coroado com o Emmy de melhor ator no ano passado. Mas de alguma forma, o segundo ano da série foi ainda mais desafiador, porque deu ao ator espaço para desenvolver Maura tanto na esfera individual como na pública. Maura havia sido uma espécie de personagem que Mort encarnava em alguns finais de semana, e só quando ele passa a vivenciá-la permanentemente que percebemos que ela é tão diferente de Mort, não é só sobre as roupas, maquiagem e cabelo. Ela quer viver diferente. Ela ainda tem sentimentos pela ex-mulher, Shelly, mas também quer ter novos relacionamentos como uma mulher trans. Ela quer dançar sem amarras na balada e ouvir as mulheres falarem e ser ouvida como uma mulher em um festival. Esses são momentos que assim como encantam Maura, a aterrorizam. Tambor é tão hábil com essa transição que sua performance está marcada nos detalhes. É o olhar de Maura enquanto ela se admira no espelho, orgulhosa, e o semblante assustado quando é perguntada se vai fazer a cirurgia de mudança de sexo. Maura se redescobre enquanto Jeffrey Tambor a descobre, e ele nos leva nessa jornada junto com a personagem, e nós a amamos e a odiamos, mas mais do que tudo, ficamos fascinados por ela.

Jeffrey Tambor (Transparent)

Matthew Rhys (The Americans)

Philip é um personagem inserido em uma situação impossível e que não dispõe de saídas fáceis. Viver décadas fingindo ser quem não é deve pesar e Philip sente esse fardo a cada missão, a cada escolha, a cada pessoa que é posta na linha de combate por sua causa. Seu plot com Martha demorou para desenrolar em algo mais interessante e urgente dentro da série, mas finalmente o casamento arranjado entre ele e a secretária chegou ao seu ápice e ao seu fim. Matthew Rhys é um ator de atuação mais contida e seu personagem dificilmente expressa claramente suas emoções, internalizando muita coisa. Correndo o risco de ser descoberto, assim como o disfarce de Martha em si, precisando tirá-la do país, fez com que Rhys entregasse seus melhores momentos ao longo das quatro temporadas de The Americans. Passando longe de ser daqueles atores que abusam do overacting, Rhys é comedido, mas ainda assim transparece para o espectador toda sua angústia, lamentação, tristeza, tensão e alívio.

Matthew Rhys (The Americans)

Kevin Spacey (House of Cards)

No meio do jogo político, agora valendo a verdadeira eleição, Francis Underwood está mais fragilizado do que nunca, perdendo a esposa e aliada, os eleitores, sendo baleado e passando um bom tempo entre a vida e a morte. Francis percebe que tudo pelo o que batalhou, todas as pessoas pelas quais teve que passar por cima, destruir ou até mesmo matá-las, está escapando de suas mãos. Fácil vem, fácil vai. Para dar o tom correto neste momento diferente da narrativa do protagonista masculino de House of Cards, Kevin Spacey precisa dar novas nuances para sua performance. O vencedor do Oscar, obviamente, não decepciona. O medo do fracasso, o cinismo e seu jeito implacável se fundem ao longo de toda temporada, forçando-o a fazer decisões que o afundam cada vez mais em suas mentiras e escolhas desprovidas de sustentação moral e ética. No season finale, o discurso de Frank serve como paralelo à realidade brasileira, com um presidente que fala que corrupção é um ponto de vista e que jamais foi a favor do impeachment de seu presidente, alegando ter apenas tentado ajudar um chefe de estado que era fraco. É a cara de pau típica de qualquer político acusado de qualquer coisa – e facilmente reconhecível ao redor do globo. Quanto mais assombroso se torna o caminho de Underwood, capaz de instaurar o medo no país e declarar guerra, mais Spacey se supera em seu trabalho.

Kevin Spacey (House of Cards)

Bob Odenkirk (Better Call Saul)

Bob Odenkirk é um ator de veia cômica e por isso Saul Goodman lhe caiu tão bem em Breaking Bad. Deve ter sido um grande desafio ser designado para um papel completamente distinto vivendo a mesma persona. É inevitável que Jimmy se torne Saul. A cada escolha, isso fica mais claro. Para cada ato, há uma consequência, e Jimmy vai aprender isso da pior maneira, segundo espera-se diante do finale. Tudo, conforme Kim aponta em “Nailed”, é devido ao seu irmão, Chuck. Ele dá seu jeitinho, tenta cortar caminhos, sempre com a melhor das intenções. Nesta segunda temporada, ele tenta ajudar Kim, mas faz isso de maneiras consideradas imorais ou antiéticas. Mesmo que Chuck o humilhe e não o apoie, Jimmy continua ali, disposto a ajudar o irmão mais velho. No fim das contas, tudo o que Jimmy quer é a aprovação de Chuck, e é nesse momento em que o advogado sênior se aproveita da fragilidade do caçula: o fato de que este se importa com as pessoas ao seu redor. Bob Odenkirk consegue interpretar esse sujeito cheio da lábia e até certo ponto ingênuo, com ardilosidade. Poucas atuações são tão cheias de nuances quanto a de Odenkirk, que sabe usar sua veia cômica em prol de uma atuação balanceada. Sério, mas nada sisudo. Engraçado, mas não escrachado. Pontual e sublime.

Bob Odenkirk (Better Call Saul)

Rami Malek (Mr. Robot)

Quando o piloto de Mr. Robot foi ao ar, Rami Malek não tinha peso algum sobre si, ninguém o conhecia e a série estreou como qualquer outra, então a obrigação de entregar algo além do convencional era mínima, mas ele o fez. Levando ao espectador toda aquela inquietação do personagem antissocial, com traços de esquizofrenia, depressão e sempre com olhares atentos aos dois cantos do rosto, ele nos embarcou em uma viagem de libertação, paranoia e conspiração dentro desse universo que o rodeia, mas do qual, definitivamente, ele não faz parte.

Rami Malek (Mr. Robot)

Justin Theroux (The Leftovers)

Os dias de paz de Kevin duraram pouco. Conforme inicia a temporada, o ex-policial se envolve num acontecimento que, ao que tudo indica, levou três garotas de Miracle. Coitado. Se parece que o rapaz é apenas um sonâmbulo, logo descobre-se que ele carrega consigo um fantasma, o de Patti, que veio lhe assombrar. Se Patti está presa num limbo entre a Terra e o purgatório, Kevin vive o inferno aqui mesmo. Sua família é despedaçada com a Partida e, durante sua nova tentativa de ter uma família nesta temporada, ele é arrastado de novo para a dor, que infelizmente não tem fim. Justin Theroux se despedaça em cena. Em sua atuação, o ator deixa transparecer todo o sofrimento, a angústia, a agonia, a melancolia que sente. Theroux se desespera para que o fantasma de Patti desapareça e o permita tentar ser feliz novamente. No entanto, nota-se que ele precisa se permitir ser feliz primeiro e perdoar-se — e perdoar Patti também. E, para isso, ele precisa provar para si mesmo que quer viver. A interpretação dele é magnética, visceral e é o cerne de toda a série. Se antes havia dúvidas do que o marido de Jennifer Anniston seria capaz como ator, após esta uma temporada espetacular Theroux apresenta-se como um intérprete de primeiro escalão, capaz de ser submetido a qualquer situação, por mais intensa, insana e emocional que seja.

Justin Theroux (The Leftovers)

Melhores Atrizes

Julianna Margulies (The Good Wife)

Em sete temporadas, Julianna Margulies nunca deixou a desejar. No ano de despedida de The Good Wife, uma das melhores séries dos últimos 10 anos, o seriado em si acabou deixando a desejar ao negligenciar seus coadjuvantes, sempre parte essencial da narrativa do programa. Apesar disso, TGW nunca careceu de boas atuações. Margulies deu o sangue em cada cena da sétima temporada, passando por um turbilhão de emoções, como entrar em crise de identidade (o que fazer da vida profissional, pessoal, amorosa, quem é ela afinal, se a vida em si tem propósito) e aprender a não ligar mais para o que os demais pensam, deixando de lado de vez o rótulo de boa esposa – a não ser que ela queira fingir ser, em benefício próprio. Desde os primeiros episódios em que fica perdida em um novo ambiente de trabalho, até explodindo de raiva quebrando pratos, desabando emocionalmente, contando os minutos pra chegar a hora “aceitável” para beber uma dose de tequila, explorando o cinismo em situações diárias e lutando, finalmente, para o que ela acha que é o ideal somente a ela e mais ninguém, Alicia Florrick entra pro rol de grandes personagens femininas da TV, em uma junção de diálogos bem escritos e atuação sempre impecável, cheia de variações, e costumeiramente sem gritos e berros, o que prova que atuar é mais do que exagerar no volume.

Julianna Margulies (The Good Wife)

Viola Davis (How to Get Away with Murder)

How to Get Away With Murder não existe sem Viola Davis, isso é fato. Mas Viola Davis transforma a advogada inescrupulosa em um show a parte. Dona das melhores expressões e diálogos, a atriz faz valer a pena ver a série. Se o roteiro às vezes deixa a desejar, Viola Davis faz por merecer cada segundo em cena. As reviravoltas podem até cansar, mas sabemos que quando Annalise Keating aparecer, tudo valerá a pena. Cheia de camadas, cada vez que descobrimos algo sobre o seu passado entendemos a complexidade de interpretar alguém tão denso. Davis é dessas atrizes que dá vontade de bater palma quando o episódio termina.

VIOLA DAVIS

Eva Green (Penny Dreadful)

Eva Green sempre foi o destaque da série desde o segundo episódio quando protagonizou uma cena de possessão, mas até aí algo muito comum. Porém nos dois anos seguintes, a composição complexa que foi criada em torno da personagem fez dela uma das melhores atrizes da TV na atualidade. Sempre portando aquele olhar marcante – ora de um vazio desesperançoso, ora de uma incansável lutadora – Vanessa Ives carregou em suas costas o peso do mundo e dentro de si conflitos de fé. Sempre rodeada de amigos, mas ao mesmo tempo tão sozinha, encontra-se constantemente no centro dos problemas e transcende para si o magnetismo do brilhante desempenho de sua intérprete que é capaz de conseguir o maior sentimento de empatia com o público fora da série, mas dentro dela toda a atenção das piores criaturas possíveis daquele universo melancólico e sombrio.

Evan Green (Penny Dreadful)

Robin Wright (House of Cards)

Enquanto seu co-protagonista encontrava-se fragilizado e amedrontado, com medo de perder tudo, a Claire Underwood de Robin Wright provou-se mais forte do nunca, expondo que o sexo frágil é o homem, com todo seu ego, vaidade e orgulho. A mulher representada por Wright cansou de ficar atrás das cortinas, enquanto seu marido é quem fica debaixo dos holofotes em cima do palco. Em seu melhor momento na série, Claire fortaleceu-se como personagem, tendo o mesmo tempo de tela que seu marido, provando ser obstinada e disposta a fazer tudo para alcançar seus objetivos. Assim, Claire também comprova que homens e mulheres podem não possuir caráter no mesmo nível. E Wright atesta seu talento em tela mais uma vez.

House of Cards

Sarah Paulson (American Crime Story: The People v. O.J. Simpson)

Sarah Paulson pode ser facilmente considerada uma das atrizes mais versáteis trabalhando na tevê atualmente, e parte disso vem de uma parceria fantástica com o produtor Ryan Murphy. Nas cinco temporadas da série de terror American Horror Story, Paulson interpretou de gêmeas siamesas a uma jornalista investigativa presa em um hospício, dando uma voz exclusiva a cada personagem excêntrico que cruza seu caminho. Então pode não vir como surpresa que Paulson encarnou a promotora Marcia Clark em American Crime Story: The People v. O.J. Simpson (também de Ryan Murphy) ao mesmo tempo que filmava a temporada mais recente de AHS: Hotel, na qual vive uma fantasma ex-viciada em heroína. Como Clark, a atriz foi capaz de realmente entrar na pele da promotora, modulando sua voz de maneira parecida, e dominando seus trejeitos, seu andar e sua habilidade no tribunal. Marcia Clark é esculpida como a verdadeira força da série, a heroína em busca de justiça, a mãe solteira, a chefe exigente, a advogada tentando emergir de um ambiente hostil, machista e parcial com a sanidade intacta. Clark pode ter perdido o caso em 1995, mas a performance de Sarah Paulson fez com que ela saísse uma vencedora em 2016.

Sarah Paulson (American Crime Story - The People v. O.J. Simpson)

Kirsten Dunst (Fargo)

Uma das poucas mulheres a integrar Fargo, Peggy está entediada com sua vida de esposa perfeitinha. Ela vive em função de fazer seu esposo feliz, porém onde fica o espaço para a sua felicidade, para ela ser a melhor pessoa que ela pode ser? Peggy é uma personagem que retrata, em certa instância, como as mulheres precisavam batalhar arduamente para conseguirem ser levadas a sério e sair do papel de dona de casa (e ainda hoje também). Sua vida começa a fazer sentido quando ela toma as rédeas do seu futuro, ainda que de modo bem problemático, e ao lado de seu marido sai em uma aventura. É claro que não há ali só o feminismo. Há uma mescla com um nível de loucura que, definitivamente, indica que a sanidade da personagem está comprometida. Peggy já não diferencia o que é a vida real e o que é miragem, a ponto que em uma situação completamente perigosa, sem casa, com bandidos e polícia atrás dela e do marido, ela só consegue enxergar que precisa se tornar melhor, ignorando tudo o que está acontecendo ao seu redor, ou no mínimo achar que pode resolver tudo sozinha. Para conseguir incorporar essas problemáticas, Kirsten Dunst alcança seu auge com um sotaque caipira, andar desengonçado e uma cara de louca que acredita em seu potencial. Falando consigo mesma, sendo retórica com outros personagens ou se inspirando em filmes na TV, Peggy é um daqueles papéis ímpares, que não se vê todo dia. E não é sempre que há uma interpretação do calibre desta entregue por Dunst.

Kirsten Dunst (Fargo)

Julia Louis-Dreyfus (Veep)

Seis vezes vencedora do Emmy, quatro delas por Veep, Julia Louis-Dreyfus continua sendo a melhor atriz de comédia da tevê. Em seu quinto ano na série, novas facetas foram adicionadas à Selina Meyer. Louis-Dreyfus consegue disparar as frases mais elaboradas e ofensivas da TV com facilidade tremenda, como se esse tipo de diálogo fizesse parte da vida da própria atriz. As expressões de nojo, raiva, confusão, desprezo, desaprovação, rara alegria e deboche são fora do comum, e a atriz mostra ter um arsenal de recursos cênicos. No season finale e, especialmente no quarto episódio da temporada, “Mew-Maw/Mother”, a atriz entrega performances balanceadas, com cargas dramáticas, algo que não se espera de uma comédia que tenta fazer o espectador rir a todo instante. Louis-Dreyfus consegue trazer gravidade à personagem e a torna real, ainda que seja uma pessoa desprezível e que só pensa no poder, passando longe de se importar verdadeiramente com alguém, e menos ainda com a nação. Nota-se que Selina é produto de sua criação com sua mãe, sendo exatamente o que fora, e fazendo com que sua filha Catherine passe por o que ela passou. Selina é desligada da realidade, mas nos momentos mais extremos, a cada derrota que sofre, vemos a emoção humana brotando nela, mesmo que por um breve instante.

Julia Louis-Dreyfus (Veep)

Melhores Episódios

American Crime Story: The People v. O.J. Simpson
S01E06: Marcia, Marcia, Marcia

Direção: Ryan Murphy | Roteiro: D.V. DeVincentis
Exibido originalmente em 8 de março de 2016.

American Crime Story: The People v. O.J. Simpson construiu sua primeira temporada como uma sucessão de recortes. O pano de fundo era o julgamento do astro de futebol americano, mas cada semana foi dedicada a um aspecto marcante do caso. “Marcia, Marcia, Marcia” mostra como a promotora Marcia Clark foi vilanizada pela defesa, pela mídia e pelo público pelo simples fato de ser mulher, mãe e ter cabelos encaracolados e – imagine que absurdo! – estar no comando de um dos casos mais importantes da justiça americana. O episódio é cruel, e se torna mais sinistro ao nos provocar com a ideia de que 20 anos se passaram, mas ainda vemos o mesmo tipo de coisa acontecer diariamente. Sarah Paulson dá um show como Marcia. Sua performance é esclarecedora, à medida que cria profundidade para uma pessoa que foi tratada como piada unidimensional até outro dia. Precisou uma série de televisão de sucesso e uma atriz do calibre de Sarah Paulson para que as pessoas reconhecessem que o tratamento que deram a Marcia Clark foi uma das maiores injustiças daquele julgamento. E mais: que a fashion police contribuiu para deixar um assassino escapar. Defina suas prioridades, América!

American Crime Story - The People v. O.J. Simpson (Marcia, Marcia, Marcia)

BoJack Horseman
S02E11: Escape From L.A.

Direção: Amy Winfrey | Roteiro: Joe Lawson
Exibido originalmente em 17 de julho de 2015.

Uma das cenas mais reveladoras da serie ocorre no episódio anterior numa conversa com Diane que questiona se o filme do Secretariat ou a peça de teatro faria BoJack feliz. Pensativo, o protagonista responde que por um momento sim, mas depois não saberia dizer. Então Diane pergunta qual a última vez que sentiu-se feliz. BoJack consegue encontrar algo em seus pensamentos e logo sabe o que tem que fazer. Vai até seu carro decidido a viajar até Tesuque, New Mexico, e assim ganhamos o excelente “Escape From L.A.”, o melhor episódio da série até agora. “Escape From L.A.” é a prova de que BoJack é o Don Draper da nossa geração. Assim como o publicitário dos anos 60 que tinha suas crises e largava a família e trabalho em busca de algo para preencher um vazio, nosso cavalo favorito faz o mesmo correndo atrás, de forma atrasada, um dos “…e se…” de sua vida. Em seus pensamentos, Charlotte representava a chance de uma vida tranquila que nunca possuiu, a chance de ser simples e feliz. Ao chegar em Tesuque e vê-la de família formada, BoJack não parece saber o que fazer. É aí que os roteiristas vão construindo, aos poucos, um episódio onde suas ações vão se tornando mais sombrias e irresponsáveis (como embebedar uma adolescente a ponto de precisar ir ao hospital), evidenciando sua personalidade autodestrutiva e fazendo o espectador ficar incomodando com a súbita aproximação dele e Penny. O clímax desse episódio é tenso e vergonhoso, porque BoJack deixa sua depressão quase arruinar uma família feliz. É difícil defendê-lo porque não há como. O episódio termina com uma fantástica montagem ao som da música de abertura, com BoJack retornando para L.A. após dois meses de sua ausência sabendo que apenas andou em círculos e que ainda está muito longe de descobrir o que é felicidade.

BoJack Horseman (Escape From L.A.)

The Leftovers
S02E06: Lens

Direção: Craig Zobel | Roteiro: Damon Lindelof, Tom Perrotta
Exibido originalmente em 8 de novembro de 2015.

Enquanto The Leftovers dividiu os críticos em seu primeiro ano, a segunda temporada é quase irretocável, transformando todas as críticas em pontos positivos, sem no entanto abandonar o que tornava a série confusa, reflexiva, misteriosa e absolutamente fascinante. Assim como a primeira temporada teve “Guest”, “Lens” também é um episódio majoritariamente focado em Nora, ainda que também ceda espaço para o resto  dos personagens. Enquanto Nora e Erika fazem de sua perda em comum um motivo para ressentimento em vez de conexão, Nora fica intrigada pela teoria das “lentes”, pessoas que seriam responsáveis pela Partida de todos ao seu redor. Desesperada pela possibilidade de ser culpada pelo desaparecimento de sua família, e talvez Evie, Nora rouba o novo questionário do departamento que investiga a Partida para fazer as perguntas a Erika, em um confronto que coloca tanto Carrie Coon como Regina King como favoritas para as premiações. Todos os detalhes estranhos sobre Miracle – o cara que mata as cabras, a mulher vestida de noiva, o homem na torre – vão se encaixando no quebra-cabeça que torna o desaparecimento de Evie e das amigas cada vez uma prova mais clara de que não há milagres em Miracle. “Lens” é poderoso como quase todos os episódios de The Leftovers, mas se destaca ao aprofundar a ideia de que as pessoas ficam mais infelizes ainda quando tentam explicar o inexplicável. Mas em comparação, simplesmente aceitá-lo pode ser ainda mais difícil.

The Leftovers (Lens)

Fargo
S02E09: The Castle

Direção: Adam Arkin | Roteiro: Noah Hawley, Steve Blackman
Exibido originalmente em 7 de dezembro de 2015.

Em uma segunda temporada irretocável e destoante de tudo o que há na tevê, Fargo finalmente entregou o famigerado Massacre de Sioux Falls. Foi o episódio em que todos os núcleos se convergiram para entregar o ápice tão aguardado. Entre os principais elementos estão a estupidez e a incompetência dos policiais, a afobação dos antagonistas em buscar vingança pelo sequestro de um dos irmãos da família, o troco de um assassino profissional, traições, situações bizarras e mortes antológicas. Tudo fornecido com uma edição fora do sério, um roteiro que une todas as pontas soltas da temporada, narração em off em forma de fábula (com Martin Freeman retornando à série apenas para servir de narrador), direção fenomenal e diálogos inspirados. “The Castle” é o maior exemplo de excelência criativa do que é Fargo.

Fargo (The Castle)

Better Call Saul
S02E09: Nailed

Direção: Peter Gould | Roteiro: Peter Gould
Exibido originalmente em 11 de abril de 2016.

Em uma temporada que representou a fase transitória entre Jimmy e aquele personagem que conhecemos em Breaking Bad, “Nailed” foi o momento onde todos os conflitos se encontraram e o maior passo para a chegada de Saul foi dado – começando pelo novo escritório tendo a pintura trocada pelos dois lados – Jimmy e Kim – que neste momento encontram-se juntos, mas que estarão sempre separados por uma linha moral. Kim foi a personagem que mais cresceu na temporada, ganhando a cada novo episódio mais confiança pela segurança de suas convicções ao mesmo tempo em que demonstrava um grande companheirismo com o parceiro. E foi exatamente por conta dela que tivemos uma das melhores cenas do episódio onde todos os lados dessa teia intrínseca de consequências e ações condenáveis convergiram dentro daquela sala onde nada eletrônico entra, com Jimmy no centro sendo atravessado por verdades disparadas por Chuck e Kim (em performances incríveis de Rhea Seehorn e Michael McKean) numa batalha de opostos, porém sem lados errados. Para coroar, Jimmy tem sua Jane se afogando em vômito na cena final, transformando-se no palco do maior embate interno entre suas personalidades na indecisão de dar o passo para trás abraçando as sombras e permanecendo no lado errado — aproximando-se mais de Saul — ou caminhando até a luz e voltado a ser o irmão cuidadoso que sempre foi.

Better Call Saul (Nailed)

The Leftovers
S02E10: I Live Here Now

Direção: Mimi Leder | Roteiro: Damon Lindelof, Tom Perrotta
Exibido originalmente em 6 de dezembro de 2015.

Apesar da queda de audiência em relação a primeira temporada, The Leftovers conseguiu, finalmente, conquistar os críticos americanos em seu segundo ano. Este episódio é só uma amostra do poder narrativo da série. Poucos programas conseguem causar tantos sentimentos diferentes no público, atraindo-no majoritariamente pela melancolia do roteiro. Desde Six Feet Under a HBO não conseguia produzir algo tão pessoal e provocativo. São produções difíceis de digerir, e assistir por assistir não é uma opção. Sem perceber, você se vê refletindo sobre questões teológicas, filosóficas e sociológicas. “I Live Here Now” é o ápice disso, evidenciando as analogias entre a cidade de Jarden com o Jardim do Éden e entre Eve e Eva. Talvez o momento mais catártico de toda a série seja a entrada dos Remanescentes Culpados no “paraíso”. É praticamente um anúncio de que aquele lugar não é abençoado, não é diferente de qualquer outra cidade com moradores arrebatados. As consequências da falsa explosão da bomba botam as duas famílias em extremos – os Murphy se desmembram com a entrada de Eve para os RC e os Garvey se unem após a destruição da cidade e o fim do purgatório de Kevin. A cena final deixa poucas opções para a última temporada, mas reage efetivamente em nossas emoções.

The Leftovers (I Live Here Now)

Penny Dreadful
S03E04: A Blade of Grass

Direção: Toa Fraser | Roteiro: John Logan
Exibido originalmente em 22 de maio de 2016.

Não há dúvidas que “A Blade of Grass” é um dos episódios mais audaciosos dos últimos tempos. Com a ação toda centrada em um quarto de sanatório, ele disseca e revela quem Vanessa Ives realmente é em seu interior. Como o quarto não tem janelas e em nenhum momento pode se ver o exterior, a passagem do tempo dentro do episódio não é bem definida, quase como se ela não existisse. No entanto, em nenhum momento ele se torna enfadonho. Isto se deve boa parte a incrível química entre Eva Green e Rory Kinnear, que simplesmente destroem na atuação, e as frequentes aparições de Patti LuPone na pele da Dra. Seward. Emocionalmente tocante, o roteiro desenvolve toda uma condição psicológica complexa. Vanessa não está apenas presa em um sanatório, ela está revivendo todos aqueles fatos dentro de um sonho hipnótico, e John Logan soube explorar isso com maestria. Se não houvesse tanto preconceito dentro da Academia com séries desse gênero, diria que este episódio e atuações são fortíssimos candidatos ao Emmy.

Penny Dreadful (A Blade of Grass)

The Leftovers
S02E08: International Assassin

Direção: Craig Zobel | Roteiro: Damon Lindelof, Nick Cuse
Exibido originalmente em 22 de novembro de 2015.

Durante sua exibição, semana após semana, The Leftovers desafiou o espectador. Na premiere da segunda temporada, fomos levados aos tempos das cavernas e, em seguida, fomos introduzidos a novos personagens, sem que houvesse preocupação por parte dos roteiristas em abordar o que aconteceu com os personagens da temporada anterior. Depois a série foi flertando entre ser uma história de família, para ser uma série que fala sobre fé e religião, mas que de uma hora pra outra se torna algo sobre mistérios e o fantástico. “International Assassin” deve ter sido um baque para o espectador que não esperava de Damon Lindelof mais uma dose do que fizera em Lost. Porém, o episódio utiliza de elementos fantasiosos e incógnitas de Lost, mas de forma consciente e com propósito — e não apenas ideias jogadas pra ver o que dá no futuro, sem levar a um ponto de conclusão, no mínimo, satisfatório. No episódio, Kevin é levado para um mundo alternativo, que pode ser interpretado como o limbo entre a vida e a morte, ou o famigerado purgatório. É ali que ele encontra Patti e precisa dar um fim nela para que, finalmente, ele consiga seguir em frente — e ela também. Há diversos subtextos, pistas e mistérios, e nem tudo é explicado de forma clara. Contudo, é inegável que “International Assassin” intriga e fascina o espectador com sua linguagem fantasiosa, confusa, melancólica e assustadora. É o típico episódio divisor de águas, que muda tudo em uma série, e certamente acaba dividindo o público. Contudo, é também aquele que mostra o potencial de uma obra e coloca o espectador para pensar durante e depois de assisti-lo. Mesmo após mais de seis meses de sua exibição, “International Assassin” ainda gera questionamentos. É inquestionável que se tornara um clássico recente da tevê e inesquecível à memória do público.

International Assassin

Melhores Séries (Comédia)

Crazy Ex-Girlfriend

Crazy Ex-Girlfriend é literalmente uma das séries menos assistidas da televisão americana, mas todas as 10 pessoas que assistem vão te dizer que é uma das comédias mais inteligentes, hilárias e diferentes atualmente, e como bônus, ainda é um musical. Criada por Aline Brosh McKenna e o fenômeno do YouTube Rachel Bloom, a primeira temporada é a história Rebecca Bunch (Bloom), uma advogada de sucesso que larga tudo para ir atrás de seu ex-namorado Josh – com quem ela passou algumas semanas em uma colônia de férias 10 anos atrás –, e se muda de Nova York para West Covina, uma cidadezinha no interior da Califórnia. Na contramão do que o título sarcástico sugere, Crazy Ex-Girlfriend é uma incrível jornada pela cabeça de uma mulher forte e decidida, ainda que as decisões de Rebecca sejam questionáveis. Todas as canções na série contam com uma produção espetacular, e todos os personagens têm seu momento debaixo do holofote. Greg, novo interesse amoroso de Rebecca, implora para que ela “se contente” com ele na homenagem aos musicais clássicos “Settle for Me“, a amiga Paula manda a real sobre amizade delas em “After Everything I Have Done For You” e o chefe Darryl se assume como bissexual no melhor estilo Footloose com “Gettin’ Bi“. Mas é mesmo Rebecca que comanda o show, questionando sua própria loucura (“I’m the Villain“), explorando o que significa ser mulher (“The Sexy Getting Ready Song“), e destrinchando sua relação problemática com a família (“Where’s the Bathroom?“).

Crazy Ex-Girlfriend

Transparent

Transparent pode não ser exatamente engraçada, mas a “dramédia” da Amazon tem um jeito próprio de te levar em uma jornada divertida. Uma série centrada em uma mulher transgênero poderia facilmente se tornar um drama pesado sobre problemas sociais, mas talvez porque os Pfeffermans são uma família rica que moram em um bairro nobre de Los Angeles, ou talvez porque Maura, Shelly, Ali, Josh e Sarah são tão narcisistas e egocêntricos, a primeira temporada de Transparent funcionava mais como uma comédia familiar, pessoal, restrita, ainda que cheia de momentos melancólicos. Nesse segundo ano, quando a busca pela identidade colide com necessidade de afirmação pública, Transparent se torna uma história muito mais cultural, explorando as ramificações sociais das escolhas que seus personagens fazem, às vezes vendendo o puro egoísmo como ações políticas. Ainda é um estudo íntimo de gênero e sexualidade, e como essa ideia se desenrola na mente de cada um, mas ao nos levar para um casamento, um festival feminista que na verdade tem preconceito com certas mulheres, e até para uma casa LGBT na Alemanha Nazista, a série finalmente deixa que a família seja julgada por outros olhos que não os seus ou do público. Transparent está mais provocativa que nunca, fazendo mais perguntas que nunca, e finalmente nos forçando a pensar no mundo que estamos construindo agora e no mundo que estamos deixando para trás.

Transparent

Review

À primeira vista, qualquer pessoa que leva extremamente a sério seu trabalho, seja qual for, e que possui convicções fortes sobre seu ofício laboral seria digna de admiração por muitos. No entanto, a tal ética ao trabalho levado ao extremo e tornando­-se uma piada por conta de condutas resultado de convicções inabaláveis, foi a tônica da primeira e, mais recentemente, da segunda temporada de Review. Quando o “crítico de vida” Forrest McNeal em seu programa de TV experimenta, analisa e avalia situações da vida das mais diversas, indo de como comer quinze panquecas e viciar­-se em cocaína, até se casar e fazer sexo dentro de um avião, o resultado são alguns dos momentos mais hilários das comédias para TV dos últimos anos. Tudo enquanto a vida do personagem principal se despedaça em nossa frente devido às estas experimentações. Sempre levando seu trabalho de crítico muito a sério, demorando a perceber o quão absurdo é se obrigar a viver situações esdrúxulas para seu show e todas as consequências hilariamente nefastas para a sua vida, na segunda temporada Forrest (e quem assiste a série) começa a perceber a exploração tanto da sua convicção e seriedade para a simples obtenção da audiência, podendo, enfim, dar nome aos bois de quem tanto fez o personagem principal fazer papel de idiota em tantas oportunidades. E entender um pouco melhor, como que por simples entretenimento televisivo, a vida e o destino de uma pessoa vão sendo manipulados destrutivamente, resultando numa mistura de sadismo, vergonha alheia e riso descontrolado para o espectador. Caminhando para um clima próximo da dramédia, a exemplo das séries Louie e BoJack Horseman, mas ainda sendo capaz de garantir um potencial em fazer rir, diria eu, maior que em séries semelhantes.

Review

Jane the Virgin

Quem diria que um dia o canal CW faria algumas das melhores séries de toda a TV, não é mesmo? Jane the Virgin pode ter nascido como sátira e homenagem às telenovelas mexicanas, mas desde seu primeiro ano mostrou ser bem mais do que isso. A segunda temporada tinha que provar que a premissa (mulher virgem fica grávida) poderia continuar funcionando, e felizmente isto se confirmou. A narrativa continua com múltiplos twists e nunca um episódio termina sem que mude o trajeto da série. As constantes surpresas, geralmente carregadas de absurdo, são um artifício que mantém o frescor, mas não é a única coisa que faz de Jane the Virgin uma das melhores coisas na TV atualmente. Muito se deve à carga emocional. As piadas continuam ótimas, o narrador é uma atração a parte, mas o seriado pega o espectador pelo coração. As relações interpessoais e a importância da família são o que regem o programa, fazendo parecer fácil criar uma série de risadas, seguida por um momento carregado de sentimentos e, de quebra, ocasionando lágrimas — na maioria dos casos, de felicidade mesmo. Jane the Virgin é uma série que continua surpreendendo, no bom sentido, e definitivamente se distingue de tudo o que está no ar atualmente.

Jane the Virgin

Master of None

Podemos ter ficado órfãos de Louie, porém Master of None chegou para ser aquela série urbana, que traz assuntos relevantes do nosso dia a dia e são apresentados de maneira realista, ainda que irreverente. Filmada de maneira cinematográfica, a série fala sobre vários tópicos pertinentes, como discussão sobre ter filhos ou não; o racismo e a falta de minorias na indústria audiovisual; as dificuldades que as mulheres passam diariamente por simplesmente terem nascido com uma vagina; como é viver a dois; as distintas realidades das gerações dos nossos pais e as nossas, e como os tratamos. Com roteiros bem escritos e atuações cômicas afiadas, a série surpreende do primeiro ao último episódio.

Master of None

BoJack Horseman

BoJack Horseman é uma das melhores dramédias já feitas para a televisão, em uma época lotada de grandes séries deste gênero. E sua segunda temporada trata da continuação da dolorida, porém engraçada, vida de um cavalo ator de televisão que conseguiu ficar rico graças a uma sitcom familiar de qualidade duvidosa nos anos 90. Na primeira temporada BoJack (Will Arnett) parecia estar colocando muito investimento emocional em algumas coisas que o fariam muito feliz. Ganhar um prêmio importante, conquistar o coração de seu novo amor e voltar a trabalhar fazendo o papel do seu ídolo. Resultado: ao fim da primeira temporada ele conquista um Globo de Ouro (mal explicado, como parece ser parte significativa dos prêmios da Associação dos Correspondentes) e na segunda usará esta estatueta até para servir de apoio como pé da cama.

Apesar da dor de perder sua amada Diana (Alison Brie) para seu amigo e nêmesis de mão única, Mr. Peanutbutter (Paul F. Tompkins), BoJack parece esquecê-la na segunda temporada entre recaídas com sua Princess Caroline (Amy Sedaris) e um novo amor, a compreensiva e esquecida Wanda (uma coruja que ficou em coma por vários anos e quando volta torna-se executiva da TV aberta, interpretada por Lisa Kudrow). Ele acaba ganhando o papel de sua vida, após voltar a mídia com o livro que ganha o Globo de Ouro (exatamente isso), será Secretariat (o lendário cavalo ganhador da Tríplice Coroa do turfe americano) em um filme que poderá lhe render prêmios e ainda mais reconhecimento. Mas se tem algo que BoJack nos mostra é que finais felizes nem sempre são felizes, aliás, em muitas ocasiões a alegria desses “finais” pode ser efêmera e pior, passageira. O prêmio é esquecido, o novo amor não o satisfaz e filme é abandonado, após ser modificado em sua essência por executivos do estúdio.

O vazio continua mostrando que não será com soluções simples que ele irá passar (como ouvir áudios de autoajuda ou começar a fazer exercícios físicos). Como numa grande terapia em forma de vida, BoJack, ao fim da temporada, começa a tratar suas questões mais internas, com sua vida atual e, principalmente, com seu passado, tentando se reconectar com seu antigo amor e com seu roomate, Todd (Aaron Paul). Passando por estranhas experiências que envolvem ele sair do seu casulo e esforçar para a sua felicidade e o bem-estar daqueles que ele quer bem, o que talvez mostre um indício de recuperação interna dessa depressão de tantos anos que ele passou. Torcemos para que ele esteja bem, mas dificilmente estará na próxima temporada. Seguirá um caminho de melhora, com seus altos e baixo, ou tudo desabará? Veremos quando a série retornar.

BoJack Horseman

Veep

Em tempos de Brexit, impeachment e governo interino (ou golpista?) no Brasil, e Donald Trump nos Estados Unidos, Veep parece mais relevante do que nunca. As manobras e alianças políticas atingem níveis de cinismo e hipocrisia altíssimos. Mais uma vez, a comédia da HBO exibe a política da maneira mais palpável possível: um monte de gente que não tem a mínima ideia do que realmente está fazendo, a não ser buscar seu posto no poder. Não há distinção entre democratas e republicamos, esquerda e direita, mas nem precisa. Em suma, notamos que poucos estão realmente preocupados com o que a nação precisa e querem apenas ter o seu nome escrito na História, mesmo que para isso sejam tomadas decisões que vão contra seus próprios princípios. Veep ainda consegue mesclar esse ambiente político com os problemas singulares de cada um dos personagens, seja a busca de um emprego, a morte de um ente querido, a adoção de um bebê chinês e uma barriga de aluguel, relacionamentos interpessoais e até um documentário para a faculdade. Não falta desenvolvimento para cada personagem, mesmo aqueles com passagem mais breve possível. Veep ainda é dona de um entrosamento perfeito entre os membros de seu elenco, que se sentem mais confortáveis do que jamais estiveram. Nada parece mecânico ou ensaiado, e cada piada soa extremamente natural — aliás, Veep parece uma das poucas comédias realmente preocupadas em fazer rir a cada minuto atualmente no ar. Mesmo que o showrunner tenha mudado e a quinta temporada tenha caído no colo de David Mandel (de Seinfeld e Curb Your Enthusiasm), a série não perdeu em nada sua qualidade, chegando aqui em seu ápice, fugindo das obviedades e criando novas situações absurdas, hilárias e outras até mesmo tocantes, mas sem nunca sacrificar as risadas por lágrimas.

Veep

Melhores Séries (Drama)

Rectify

Dizem que quando as lembranças são muito doloridas, a memória produz labirintos que as embaraçam, confundem a reconstituição de certos eventos, como se aquele que as guarda vivesse em conflito com seu próprio espírito: lembrar e viver em dor ou esquecer e se anestesiar. Rectify é a história de como esse conflito perturba Daniel Holden (Aden Young), que passou quase 20 anos preso, à espera da execução, porque confessara ter estuprado e matado a namorada, Hannah Dean, em um lago da Geórgia. Antes de ser solto, devido a uma reviravolta na investigação e o levantamento de dúvidas sobre sua culpa, Daniel já se apercebera que, de qualquer forma, entre lembrar e esquecer há dores que não podem ser aliviadas, tormentos quase intransponíveis e, no seu caso, um desejo incorrigível por experimentar o sentido do mundo, a libertação que, para ele, apenas a lembrança traria.

A trajetória de Daniel, depois de atravessar duas temporadas que falaram, sobretudo, de como seus desenganos e esperanças tiveram que conviver entre si e com outras perspectivas dessas sensações, apresentando personagens com conflitos tão palpáveis quanto os dele, em suas próprias complexidades, constrói uma terceira parte marcada por choques de uma realidade que não espera pela estabilidade dos espíritos que se perturbam na procura dos sentidos do mundo. Após encarar a culpa por ter ferido a estabilidade daqueles que estavam ao seu redor em sua adaptação à vida fora da prisão, marcado pelos aprendizados e ligações que edificou enquanto estava preso, a terceira temporada anuncia o renascimento de Daniel, sua redenção.

Rectify

American Crime

Não é exagero dizer que essa é uma das séries mais importantes da atualidade e que entra na categoria das melhores séries que ninguém — ou quase ninguém — assiste. Exibida surpreendentemente pela ABC, American Crime entrega uma segunda temporada pertinente e que foge do lugar comum do que estamos acostumados a ver na TV aberta americana. Taylor Blaine alega ter sido estuprado em uma festa por um dos jogadores do time de basquete de uma famosa instituição escolar e agora sua mãe vai atrás de justiça numa trama complicada que envolve diversos personagens. A equipe de roteiristas encabeçada por John Ridley (roteirista de 12 Anos de Escravidão) utiliza dessa história para explorar temas como problemas familiares, falta de empatia, estupro, racismo, homofobia, cyber bullying, entre outros — coisas que, infelizmente, acontecem todos os dias. De certa forma, American Crime lembra os trabalhos de David Simon (The Wire, Show Me a Hero), mais preocupado em evidenciar problemas sociais do que apresentar uma trama que só entretenha. Por isso que muitos ficaram decepcionados ao assistir a season finale esperando por respostas e esclarecimentos. No caso desta série, o que realmente importa é como o que é abordado em tela afeta a sua visão para as adversidades do dia a dia.

American Crime

Better Call Saul

A primeira temporada de Better Call Saul provou que a série tem sua própria identidade, e não vive à sombra de Breaking Bad. A segunda temporada tinha como função mostrar se conseguiria continuar evoluindo, sem forçar conexões com a série que a originou. Felizmente, BCS se supera. O programa mantém sua originalidade, seguindo uma narrativa focada em seus personagens e nada mais. O desenrolar da história é lento, sem afobação. Com isso, nota-se que Vince Gilligan e Peter Gould têm muita lenha pra queimar e podem transformar a jornada de James McGuill em Saul Goodman em uma longa caminhada, e extremamente prazerosa. Há vislumbres de Saul nas escolhas de Jimmy, assim como é possível sentir que Mike está andando em direção a seu destino como capanga de Gus Fring. Entretanto, não há pressa. Os roteiristas querem curtir cada episódio, passando boa parte da temporada criando plots, personalidade e motivações para personagens originais, como Kim e Chuck. Como numa orquestra, Gilligan e Gould sabem conduzir todos os seus elementos perfeitamente, iniciando com sutileza, aumentando o tom ao longo da peça e entregam um grandioso último ato.

Better Call Saul

American Crime Story: The People v. O.J. Simpson

O envolvimento de Ryan Murphy em qualquer coisa merece ser apreciado com moderação e desconfiança. Ele é o cara que tem ótimas ideias, mas raramente consegue ter êxito em desenvolvê-las. Felizmente, Murphy serviu apenas como produtor executivo e diretor de quatro dos 10 episódios da série, não mexendo no roteiro — ou seja, entende-se como American Crime Story: The People v. O.J. Simpson foi uma das melhores coisas da TV nos últimos 12 meses. O julgamento mais conhecido da Justiça dos Estados Unidos merece um espetáculo apropriado e o modo de filmar de Murphy é perfeito para isso e funciona, havendo um tom semelhante em todos os demais capítulos. Apesar de ter sido um evento midiático, a série é muito mais do que apenas o sensacionalismo dentro do tribunal. Durante os 10 episódios, há vários temas abordados, como a facilidade com que a mídia manipula as massas, machismo, sexismo, racismo, o poder da fama e da opinião pública, como advogados conseguem influenciar um júri inteiro, e como as coisas nem sempre são o que parecem ser. São plots que poderiam não ser atrelados à história, optando por focar mais em O.J. em si e no julgamento, mas a série contextualiza e problematiza o quadro geral, ecoando em situações encontradas ainda no nosso cotidiano.

American Crime Story - The People v. O.J. Simpson

The Americans

Em todos seus quatro anos de existência, The Americans foi um dos dramas mais incríveis da tevê – e digo isso não como sinônimo de beleza (o que foi), mas como louco demais para ser verdade (e no entanto era). Apesar de ser uma história de espionagem que toma rumos inesperados o tempo todo, a série é mais afiada quando se preocupa com o drama familiar, e é isso que faz dessa temporada a melhor até agora. Com a revelação de Philip para Martha sobre seu real trabalho e a inserção de Paige no mundo dos espiões russos, as coisas tomam outro ritmo, as missões desaceleram e o emocional toma conta da vida de Elizabeth como nunca tínhamos visto antes, chegando a um ponto tão sem volta que eles são obrigados a tirar férias da KGB. De um jeito ou de outro, The Americans sempre conseguiu entrar na cabeça de Elizabeth e Philip, fazendo com que a relação deles com o trabalho fosse mais importante do que o trabalho em si. Mas a adição da jornada de Paige, uma adolescente que ainda nem estava pensando sobre uma possível profissão, alguém que não tem conexões com a Mãe Rússia como seus pais têm, que está simplesmente tentando se adaptar ao estilo de vida levado por sua família, isso tudo é o que muda o jogo dessa temporada. Honestidade pode ser uma causa nobre, mas ninguém te diz o que acontece quando é a pior saída possível. The Americans o faz.

The Americans

Fargo

Enquanto Hannibal mostra o horror e a beleza que há por trás da violência, de tirar a vida do outro, Fargo vai na contramão. Assim como fizeram os irmãos Coen no filme que deu origem à série e Noah Hawley na primeira temporada, este segundo ano consegue capturar novamente o espírito da obra, tratando a violência com exageros e absurdos, flertando com o cômico. Novamente, o seriado aposta em uma história de coincidências infelizes e pilhas de corpos, mas sem precisar copiar em nada a temporada anterior. Aqui há duas pessoas normais inseridas num contexto que não lhes pertence, tudo por conta de um infortuno acidente e, diante de disso, precisam lidar com uma situação fora do comum e altamente perigosa.

Ambientado nos anos 70, a série consegue trazer temas pertinentes aos EUA naquela época, criando propositalmente um link entre o passado e o presente. Peggy Blumquist (Kirsten Dunst) é uma das conexões com o atual. Em tempos de feminismo em alta (finalmente, sociedade!), a personagem representa muito bem a mulher daquela década e, de certa forma, a atual. A sociedade machista não conseguia crer que um ser do sexo feminino poderia realizar atividades como ir à faculdade, se tornar independente. Se for pra trabalhar, o dinheiro tem que ir direto para o que é de vontade do marido. Ela tem que ser a dona de casa, estar com o jantar pronto para quando o esposo regressar. Ela tem que servir e não viver para si. É claro que Peggy tem lá seus delírios, porém a personagem quer provar para si e para o mundo que ela, uma mulher, pode ir muito além, que ela pode ser extraordinária – e, de certa forma, ela consegue provar o seu ponto.

A bagunça que se cria na narrativa é perfeitamente orquestrada e tudo parece dentro de ordem. Cada personagem, por menor que seja sua participação, é uma peça fundamental para a situação kafkiana montada. De tão maluco que Fargo é, a aparição de um disco voador é tido como normal diante de um cenário de chacina e infelizes coincidências. Com um deboche aqui, uma crítica ali, e um toque de violência gratuita, Fargo forma um círculo perfeito, sem arestas, com um elenco fantástico e uma qualidade técnica impecável. Ou seja, não foi contagiado pelo mal de True Detective.

Fargo

The Leftovers

A primeira temporada de The Leftovers foi cheia de altos e baixos. Se alguns episódios estão entre os melhores de 2014, outros eram arrastados, entediantes e até irritantes. Visto os erros, Damon Lindelof foi lá e mudou os rumos da série, trazendo novos personagens, alguns rostos conhecidos, em meio a um cenário completamente diferente – nesta cidade, Miracle, não houve nenhum sumiço repentino. Brilhantemente, o seriado se reinventou. Nisso, tornou-se uma história não de um protagonista e seus coadjuvantes, mas de um grupo e seus indivíduos. Cada personagem tem seu momento na temporada, que invoca as coisas positivas da primeira temporada, adicionando novos questionamentos e novas vertentes.

Ainda sem explicar qualquer coisa em relação à partida de milhões de pessoas, o programa se beneficia do fato, deixando claro que prefere se focar naqueles permaneceram ao invés dos que partiram – aparentemente, Lindelof aprendeu que o mistério não é a chave neste caso como era em Lost. A conexão com a religião, crenças e a Bíblia é explícita. A fé (no sentido religioso ou não), a dor, o luto e a família são chaves para a narrativa, que explora os piores pesadelos dos personagens desta cidade, em tese, divina. O mundo criado em The Leftovers é o limite entre o céu e o inferno, um lugar onde os humanos são obrigados a conviver com uma dor insuportável, tornando difícil achar uma razão para viver. Iniciando a temporada nos tempos das cavernas, para posteriormente mergulhar no surrealismo numa espécie de purgatório (ou vida pré-morte, vai saber), finalizando sua narrativa em um caos apocalíptico, The Leftovers entregou uma das melhores temporadas da história recente da TV, provando entender a alma atormentada do ser humano como poucos.

The Leftovers

Melhores Séries (Comédia) pelo voto popular

Melhor Série (Comédia) - voto popular

Melhores Séries (Drama) pelo voto popular

Melhor Série (Drama) - voto popular

O corpo de jurados citou, durante a eleição, 36 atrizes coadjuvantes, 44 atores coadjuvantes, 31 atrizes, 32 atores, 51 episódios, 33 séries de comédia e 30 séries de drama.

Textos por Rodrigo Ramos, exceto “Constance Zimmer (UnREAL)” por Régis Regi; “Alison Wright (The Americans)” e “The Leftovers — S02E10: I Live Here” por Mikael Melo; “Andre Braugher (Brooklyn Nine-Nine)“, “Carrie Coon (The Leftovers)“, “Regina King (The Leftovers)” e “Viola Davis (How to Get Away with Murder)” por Dierli Santos; “David Tennant (Marvel’s Jessica Jones)“, “Review” e “BoJack Horseman” por Cristian Dutra; “Penny Dreadful — S03E04: A Blade of Grass” por Rafael Bürger; “Alan Cumming (The Good Wife)“, “Rhea Seehorn (Better Call Saul)“, “BoJack Horseman — S02E11: Escape From L.A.” e “American Crime” por Rafael Mattos; “Rami Malek (Mr. Robot)“, “Eva Green (Penny Dreadful)” e “Better Call Saul — S02E09: Nailed” por Douglas Couto; “Rectify” por Gláucia Freire; “Jaime Camil (Jane the Virgin)“, “Jeffrey Tambor (Transparent)“, “Sarah Paulson (American Crime Story: The People v. O.J. Simpson)“, “American Crime Story: The People v. O.J. Simpson — S01E06: Marcia, Marcia, Marcia“, “The Leftovers — S02E06: Lens“, “Transparent“, “Crazy Ex-Girlfriend” e “The Americans” por Ana Carolina Nicolau.

Fizeram parte do juri
Ana Carolina Nicolau, editora dos sites Séries do Momento e Take 148.
Dierli Santos, jornalista.
Matheus Pereira, jornalista e editor do site Mix de Séries.
Dana Rodrigues, editora do site Diário de Seriador.
Mikael Melo, estudante de Jornalismo, colaborador do Previamente e The Series Factor.
Douglas Couto, aficionado em séries.
Rafael Mattos, estudante de Jornalismo.
Cristian Dutra, aficionado em séries.
Rafael Bürger, colaborador do site Diário de Seriador.
Fillipe Queiroz, aficionado em séries.
Gláucia Freire, aficionada em séries.
Regis Regi, estudante de Cinema e Audiovisual.
Rodrigo Ramos, editor do Previamente e colaborador do site Culture-se.

Imagens: FOX, CBS, The CW, HBO, AMC, Netflix, Lifetime, FX, Amazon Instant Video, USA, ABC, Showtime, Comedy Central, Sundance.

Confira também as listas dos anos anteriores
Melhores da TV na Temporada 2014/2015
Melhoras da TV na Temporada 2013/2014
Melhores da TV na Temporada 2012/2013
Melhores da TV na Temporada 2011/2012
Melhores da TV na Temporada 2010/2011

Da Redação

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