Melhores Séries (Não-Ficção) da Década de 2010

Last Week Tonight with John Oliver, Making a Murder e RuPaul’s Drag Race estão presentes na lista. 

A década de 2010 foi muito importante para a história da televisão. Seguimos na terceira Era de Ouro da TV, com a ascensão dos dramas protagonizados por homens difíceis e protagonistas que vivem em uma área cinzenta onde nem sempre se fica do lado deles, mas ainda assim você consegue entender suas motivações. Também vimos a TV a cabo consolidar-se como o local das grandes narrativas, além de termos o advento dos serviços de streaming, que rapidamente estão tomando conta do mercado e deram vida a uma nova prática cultural: o binge watching (o equivalente ao nosso “maratonar”).

Os anos 10 também foram marcados pelo Peak TV, quando basicamente todos os canais estão produzindo conteúdo roteirizado — só em 2018, 495 programas roteirizados foram produzidos nos Estados Unidos. A quantidade nem sempre se traduziu em qualidade, mas com toda certeza, dentro e fora dos EUA, o grande volume de séries e vários meios de transmissão puderam contribuir para uma pluralidade maior de vozes, seja à frente ou atrás das câmeras.

Tudo isso é para dizer que nunca tivemos tantas opções — e tão pouco tempo para assisti-las. Com tanta oferta e produções de alta qualidade, fica difícil escolher apenas alguns destaques em um único ano, quiçá em 10 anos. Contudo, aceitamos a tarefa e fizemos aqui a lista definitiva do que houve de melhor na TV durante a década de 2010, entre episódios, atuações e séries.

Confira abaixo as melhores séries (não-ficção) da década de 2010. 

MELHORES SÉRIES (NÃO-FICÇÃO)

7. RuPaul’s Drag Race

A década de 2010 na cultura pop provou ser das drag queens. Nunca tivemos tantas presentes na TV e na música — inclusive, elas vêm salvando a música pop no Brasil, obrigado Pabllo Vittar e cia. RuPaul’s Drag Race definitivamente ajudou na popularização da cultura drag e na aceitação desse grupo. A série não é um mero reality show competitivo, mas também um fenômeno, com humor ácido, shades, momentos icônicos, além de ser uma janela para a representatividade (não apenas pessoas LGBTQ+, mas também de origens e cor de pele diferentes) e contar histórias comoventes de seus participantes, trazendo o elemento humano para o programa, o que certamente contribui para seu sucesso — e seus 13 troféus Emmy. — Rodrigo Ramos

6. America To Me

Longe de procurar um jeito de “salvar” uma turma ou uma escola ou de tentar brincar de forma por vezes mais intensa, por outros mais singela com o difícil cotidiano escolar dos alunos das escolas públicas dos EUA como muitos filmes e séries fizeram ao longo dos anos, America to Me tomou o desafio de mostrar o que se passa no cotidiano dos mais diferentes atores do cenário educacional da escola pública mais desigual racialmente dos EUA. Pensando a educação de uma forma ampla, a série documental de 10 episódios acompanha principalmente alunos, mas também professores e equipe pedagógica não somente pela escola, mas entre as suas famílias e grupos de amigos, para entender, da maneira mais ampla possível, como tais situações são refletidas no ambiente escolar. A opção por mostrar de maneira crua a dor de estudantes que não conseguem aprender, dos considerados problemáticos ou dos que passam necessidades materiais no início da série em contraste com dos que a cada dia se veem mais perto do que é esperado para eles, com ajuda familiar e não sendo vítimas de preconceito por conta da raça e origem social na metade da temporada, parece ter a intenção de diminuir o sentimentalismo sobre o tema e mostrar como a educação é uma das principais engrenagens da produção de desigualdades. — Cristian Dutra

5. Full Frontal with Samantha Bee

O mundo dos late night talk shows é tomado por homens — em sua vasta maioria, homens brancos. As mulheres, infelizmente, sempre tiveram um espaço bem pequeno — Joan Rivers, Wanda Sykes, Mo’Nique, Robin Thede, Chelsea Handler e Busy Philipps são os nomes que tiveram chance de estrelar seus próprios late night shows desde a década de 80 até os anos mais recentes, mas poucas conseguiram passar sequer dos dois primeiros anos. Em 2019, Lilly Singh conseguiu o seu próprio na NBC. A canadense Samantha Bee, correspondente de maior longevidade no The Daily Show — foram 12 anos! — , a partir de 2015, se tornou a única mulher (na época) a estar apresentando um late show, ainda que fosse somente uma vez na semana ao ar. Full Frontal with Samantha Bee foi ficando marcado pela sua maneira nada formal e bastante crítica (sem papas na língua para criticar tanto Barack Obama quanto Donald Trump) em abordar os assuntos, mas principalmente dando uma visão mais representativa, seja pelos olhos das mulheres quanto de outras minorias (seu quadro de roteiristas é bastante diverso). Isso, é claro, sempre com bastante humor, por vezes bem debochado. Além disso, ela apresenta esquetes, entrevistas e reportagens fora da curva do que normalmente é produzido pelos late night shows atuais. Hoje, seu programa é referência no gênero e se mantém como um dos mais relevantes no ar. — Rodrigo Ramos

4. The Jinx: The Life and Deaths of Robert Durst

A minissérie dirigida e roteirizada por Andrew Jarecki contou em seis episódios a história de vida e detalhou os crimes ao que o magnata da construção civil Robert Durst foi acusado. Quase sempre num tom levemente cômico — ideal para contar uma história que beira o absurdo — a série documental percorre mais de 60 anos da vida pública e privada de Durst, além das personagens que conviveram com o mesmo e os diversos homicídios a que foi acusado — mas até então sempre provando sua inocência. Percorrendo casos que envolvem desde momentos curiosos como sua relação com personalidades e o establishment de Nova York e esconder-se no interior americano durante muito tempo vestido como mulher, até momentos tensos como ter sido testemunha de um suicídio e ser acusado de ocultação e mutilação de corpos, a série, mesmo que sendo documental, segue para um dos maiores desfechos da história da TV. Uma história tão inacreditável que jamais poderia ter sido uma obra de ficção. — Cristian Dutra

3. O.J.: Made in America

O documentário de sete horas e meia, dividido em cinco partes e vencedor do Oscar de melhor documentário (possivelmente a única série a ter vencido o Oscar) é essencial para entender a América que temos hoje. Enquanto a série limitada The People v O.J. Simpson foca-se mais na questão do circo midiático criado durante o julgamento de O.J. Simpson, o doc vai mais a fundo, avaliando toda a vida de O.J. e criando um paralelo sobre sua ascensão e queda dentro do período histórico em que esteve inserido, onde o racismo deliberado (civil e judicial) cobrava um preço exorbitante da população negra dos Estados Unidos, preço esse que até hoje ainda está sendo pago e está longe de ser quitado. — Rodrigo Ramos

2. Making a Murderer

O público se mostrou mais interessado do que nunca em casos criminais reais, e especialmente naqueles que expunham falhas no sistema judicial, na década de 2010. Boa parte da culpa pelo sucesso de séries como The Act, American Crime Story e Wild Wild Country, entre outros, no entanto, é de Making a Murderer. Um verdadeiro fenômeno quando a Netflix liberou a primeira temporada, em 2015, ela é também a melhor da avalanche de séries documentais produzidas pela plataforma.

As documentaristas Moira Demos e Laura Ricciardi trouxeram uma abordagem pragmática, exaustivamente completista, para a história de Steven Avery. Embora pipoquem sites por aí apontando contradições à alegação de inocência do protagonista, Demos e Ricciardi são exemplares ao basear o seu documentário não nessa alegação, mas na colocação, quase incontestável, de que a polícia agiu de má fé, ou ao menos com grossa incompetência, no caso.

Ainda melhor é o segundo ano da produção, lançado em 2018, que se foca no tortuoso processo de apelação a uma sentença dentro do sistema judicial norte-americano. Mais punitiva do ponto de vista burocrático do que a primeira temporada, a volta de Making a Murderer provou que poucas peças de televisão foram mais importantes do que ela na última década. — Caio Coletti

1. Last Week Tonight with John Oliver

A proposta de Last Week Tonight já tem um viés cômico por si só, que é debater o que aconteceu na semana passada. O formato do programa mexeu com as estruturas dos late shows. O formato de apresentação de telejornal além de servir de recap para o que houve de melhor (ou pior, na maioria dos casos) na semana nos Estados Unidos e no mundo (o Brasil já apareceu por lá, seja para falar do impeachment de Dilma Rousseff até os perigos de se ter um presidente como Bolsonaro), também traz temas relevantes (alguns nem tão atrativos à primeira vista, mas que agregam), com vasta pesquisa e ótimas piadas para quebrar o formato jornalístico padrão. Desde 2014, o programa tratou de temas como crise migratória, a ascensão do autoritarismo no mundo, movimento anti-vacina, leis relacionadas ao aborto, leis eleitorais, o débito estudantil nos EUA, segregação nas escolas, Edward Snowden e vigilância do governo, como é fácil abrir igrejas, entre outros. Há espaço para muita comédia, como o musical no segmento dos SLAAP suits, a compra de bonecos de cera de presidentes estadunidenses (e criação de curtas estrelados por eles e Laura Linney, Anna Kendrick, James Cromwell, e Tom Hanks), os quadros de chacota feitos especialmente para o público do Reino Unido já que é proibido o uso de imagens do parlamento em programas de comédia por lá, e presentear uma das últimas locadoras Blockbuster com o Jockstrap usado por Russell Crowe em A Luta Pela Esperança.

Last Week Tonight virou uma espécie de referência, que é sentida em vários late night shows da atualidade, com quadros mais segmentados e que investem tempo para desenvolver com mais qualidade o tema tratado, como é possível notar em Late Night with Seth Meyers (em especial, no quadro “A Closer Look”), Patriot Act e Full Frontal with Samantha Bee, mesmo que nem todos sejam apresentados atrás de uma mesa.

Por conta da excelente escrita, o vasto trabalho de pesquisa, pautar as conversas no meio político e social, a transformação no formato dos late shows, além da capacidade de se manter sempre atual, são detalhes que fazem de Last Week Tonight with John Oliver o talk show e também a série de não-ficção mais importante desta década. — Rodrigo Ramos

Menções honrosas: Wild Wild Country, Chef’s Table, Queer EyeThe Late Show with Stephen ColbertThe Daily Show with Trevor Noah.

Continue a leitura clicando nos links abaixo ou volte para a publicação original aqui.

Textos por Breno Costa, Caio Colletti, Carissa Vieira, Cristian Dutra, Diego Quaglia, Diogo Pacheco, Douglas Couto, Luiza Conde, Mariana Ramos, Régis Regi, Valeska Uchôa, Zé Guilherme, André Fellipe, Rafael Bürger, Leonardo Barreto & Rodrigo Ramos

Produção, edição e redação final por Rodrigo Ramos

 

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