Elle, Aquarius, Carol, A Chegada e Rogue One estão entre os 20 melhores longas-metragens do ano passado.
Em tempos de pós-verdade, fatos alternativos, xenofobia, racismo, homofobia, preconceito em geral, guerra, corrupção, conservadorismo extremo, entre outros problemas do cotidiano, o cinema ainda serve como um cano de escape para nos desligarmos da realidade. Porém, as produções (ao menos, as de alta qualidade) parecem mais interessadas em trazer temas atuais, vividos no dia a dia, seja em forma mais fantasiosa no meio de um ataque zumbi ou numa invasão alienígena, ou em uma animação sobre animais. Histórias retratam uma visão da classe média, abrem discussão sobre estupro, falam de amor lésbico nos anos 50, exploram as questões raciais, e também exaltam o poder e a necessidade do jornalismo. Em 2016, se teve de tudo um pouco, e o Previamente selecionou os 20 filmes exibidos no Brasil no ano passado que merecem nosso destaque. Confira!
20. O Regresso (The Revenant)
Direção: Alejandro González Iñárritu
Elenco: Leonardo DiCaprio, Tom Hardy
Inspirado em uma história, O Regresso é cheio de pretensões e tem um ar de arrogância, o que é compreensível sendo que o diretor é Alejandro González Iñárritu, o mesmo que recomendou que o longa fosse assistido num templo para ser devidamente apreciado. De certa forma, a sensação é de que a película trata-se da continuação da história de Pocahontas, e a ideia se reforça porque Iñárritu chamou para a produção a figurinista Jacqueline West, o desenhista de produção Jack Fisk e o diretor de fotografia Emmanuel Lubezki, todos envolvidos em O Novo Mundo, de Terrence Malick. Aliás, se tem algo que o diretor mexicano faz aqui é copiar (ou homenagear?) a filmografia recente do cineasta americano. Resumidamente, O Regresso é uma jornada tortuosa sobre vingança e nada mais. Se em termos de roteiro apresenta pouca originalidade (tanto que das 12 nomeações ao Oscar do ano passado, a de roteiro não foi uma delas), os fatores técnicos ressaltam aos olhos. A direção de fotografia de Lubezki é de tirar o fôlego e as paisagens idem. Some isso com a performance visceral de Leonardo DiCaprio e você tem um filme que precisa ser visto, ainda que não seja pela história.
19. Invasão Zumbi (Busanhaeng)
Direção: Sang-ho Yeon
Elenco: Yoo Gong, Soo-an Kim, Yu-mi ung, Dong-seok Ma
Os zumbis voltaram à moda há alguns anos com The Walking Dead, primeiro nos quadrinhos e depois na tevê. O cinema, principal sítio dos morto-vivos, há tempos não consegue emplacar um filme decente do gênero. Até que na Coreia do Sul veio a esperança. Como a maioria dos filmes desse tipo, Invasão Zumbi tinha tudo para ser ruim. Porém, a trama consegue introduzir personagens cativantes e odiáveis (no bom sentido, afinal precisamos de antagonistas vivos), ainda que sejam rapidamente introduzidos e logo jogados em meio à ação. Os zumbis são sinistros e aterrorizantes (assim como a transformação), a ação é ágil e agoniante (especialmente porque a maior parte dela passa dentro de um trem), e as críticas sociais estão lá, localizadas em pontos cruciais da trama, seja falando da manipulação da mídia ou simplesmente apontando o egoísmo e fala de empatia do ser humano. Questões sociológicas e antropológicas são postas em pauta aqui para quem quiser ler nas entrelinhas, porém, quem busca apenas diversão, encontrará em Invasão Zumbi entretenimento de primeira.
18. Café Society
Direção: Woody Allen
Elenco: Jesse Eisenberg, Kristen Stewart, Steve Carell, Blake Lively, Jeannie Berlin, Corey Stoll, Ken Stott, Parker Posey
Assistir a um filme de Woody Allen pode gerar tanto um reconhecimento quanto um afastamento na mesma intensidade, dependendo de seu tema. Café Society, no entanto, parece respirar melhor do que seu colega anterior, Magia ao Luar. Não supera, é claro, o magnetismo irresistível de um Blue Jasmine ou o clássico Manhattan, mas o seu roteiro esperto, cheio de situações tragicômicas, além de uma ambientação em uma época que pode parecer mágica por si só para vários cinéfilos por aí faz com que Café Society flua de maneira mais harmônica, mais orgânica. As cerejas do bolo aqui são as atuações de Jesse Eisenberg e a surpreendente Kristen Stewart, deixando cada vez mais para trás seus tenebrosos dias de Crepúsculo.
17. O Que Está Por Vir (L’avenir)
Direção: Mia Hansen-Løve
Elenco: Isabelle Huppert, André Marcon, Roman Kolinka
O longa da diretora Mia Hansen-Løve acompanha Nathalie (Isabelle Huppert, em uma atuação soberba), uma professora de filosofia em uma escola secundária em Paris. Tudo parece bem, com seus alunos, trabalho, sua mãe, filhos e marido, até que um fato em especial a obriga a sair do status quo adquirido ao longo da vida. Não espere por grandes viradas no roteiro, porque não é o caso aqui. O Que Está Por Vir é uma obra que se descobre nos detalhes, nas nuances da atuação de sua protagonista, que também vai se redescobrindo conforme o longa avança. É um filme poético, sensível e filosófico, com espaço para discussões edificantes e questionamentos morais, além de defender que há sempre a possibilidade de um novo início após cada final.
16. Steve Jobs
Direção: Danny Boyle
Elenco: Michael Fassbender, Kate Winslet, Seth Rogen, Jeff Daniels
Steve Jobs foi uma das figuras mais icônicas da contemporaneidade. Dividindo opiniões, que vão de gênio perfeccionista da criação tecnológica, até oportunista sem escrúpulos que levou todo o crédito ofuscando a imagem de seus colaboradores. Independente de sua visão sobre o sujeito, é impossível negar a figura interessante que o mesmo foi. Relevante o suficiente para dois anos após sua morte, idealizaram dois filmes sobre sua vida; um medíocre, estrelado por Ashton Kutcher, e outro dirigido por Danny Boyle. A diferença entre as duas obras, que reflete pontualmente na qualidade, é a consciência que boa parte do público já conhece a história do CEO da Apple — que, inclusive, já havia sido contada em uma cinebiografia para a televisão no final dos anos 90. O longa de Boyle não tem interesse em contar toda a história do co-fundador da Apple. Os três atos são divididos nos minutos que antecedem as conferências mais relevantes de sua vida, não estabelecendo nenhuma ligação temporal direta entre elas, o que é um acerto gigantesco, por explorar minuciosamente as relações interpessoais de Jobs e expôr ao público as drásticas mudanças que o mesmo passou durante os anos. Mudanças que refletem em todos os recursos de linguagem disponíveis, alternando em cada ato o ritmo da montagem, as cores predominantes em cena e obviamente o figurino; porém sem perder a coerência estética. Com uma atuação memorável de Michael Fassbender, e uma direção ritmada e eficiente de Danny Boyle, Steve Jobs se consolida como a maior cinebiografia de 2016.
15. Julieta
Direção: Pedro Almodóvar
Elenco: Emma Suárez, Adriana Ugarte, Daniel Grao, Inma Cuesta
Apesar de a crítica e, às vezes, parte do público, não aprovar mais os filmes de Almodóvar, alguns de seus últimos trabalhos merecem uma atenção especial, vide o insano A Pele Que Habito. Com Julieta, o diretor parece eleger uma nova musa na pele da arrebatadora Emma Suárez. E acerta. Sua atuação, o cerne do filme, não só cria uma conexão imediata com o público, como faz desse último trabalho do espanhol um longa pungente, dolorido. Entre temas como a depressão e a perda, a intensidade de uma paixão avassaladora e os escrúpulos necessários durante um luto problemático, Julieta toma como base contos de Alice Munro para emocionar e, muito além, fazer seu público refletir sobre as questões profundas da vida. Viver, amar, morrer e renascer. Filmão.
14. Sing Street
Direção: John Carney
Elenco: Ferdia Walsh-Peelo, Kelly Thornton, Maria Doyle Kennedy, Jack Reynor, Aidan Gillen
Apesar de uma carreira breve, o irlandês John Carney já havia conquistado um público devoto com seus dois sucessos musicais anteriores, Apenas Uma Vez e Mesmo Se Nada Der Certo. Sing Street é outra pérola indie de Carney. Uma semi-autobiografia sobre crescer em um internato em Dublin, colorida com uma paixão adolescente, uma amizade entre irmãos e muita música vinda diretamente dos anos 80. O elenco jovem é charmoso e entrosado, e a química entre os protagonistas, Ferdia Walsh-Peelo e Lucy Boynton, faz com que a aventura amorosa deles mereça toda nossa torcida. Diferente da grande maioria dos filmes sobre bandas escolares, as canções em Sing Street parecem autênticas, não só para a época, mas também para a progressão artística do grupo formado quase ao acaso. O filme consegue capturar a magia da produção musical, mas especialmente o papel que a música tem como inspiração nessa fase da vida. Muito engraçado em alguns momentos, agridoce em outros, Sing Street é como qualquer boa banda: pode te fazer sorrir e chorar, mas principalmente vai te fazer deixar suas músicas no repeat.
13. Rogue One: Uma História Star Wars (Rogue One: A Star Wars Story)
Direção: Gareth Edwards
Elenco: Felicity Jones, Diego Luna, Alan Tudyk, Donnie Yen, Wen Jiang, Ben Mendelsohn, Guy Henry, Riz Ahmed, Mads Mikklensen, Forest Whitaker
O primeiro spin-off de Star Wars nem é tão desprendido assim da saga da família Skywalker, porém é desgarrada o suficiente para conseguir criar sua própria identidade. Rogue One amplia a mitologia da franquia, traz personagens sólidos, imprime uma estética visual distinta da franquia original, tem um arco fechado (não vai ter Rogue Two, garanto) e ajuda a colocar a saga, altamente fantasiosa, em um terreno mais próximo da realidade, onde a vida é frágil, o totalitarismo está a um passo de nós (oi, Trump) e a guerra é um banho de sangue. É o Band of Brothers de Star Wars com doses acertadas de fan service.
12. Deadpool
Direção: Tim Miller
Elenco: Ryan Reynolds, Morena Baccarin, T.J. Mller, Ed Skrein, Brianna Hildebrand, Stefan Kapicic
O único filme baseado em HQs e super-heróis na lista dos melhores de 2016 é aquele pouco acreditado, de baixo orçamento, e que subverte e tira sarro do gênero. Deadpool acaba seguindo sim uma receita do nicho (um cara normal ganha super poderes, não pretende ser um grande herói, mas inevitavelmente precisa enfrentar o vilão, que ameaça a vida do seu interesse amoroso), mas ele aborda essa fórmula com humor escrachado, quebrando a quarta parede, com violência, sangue e definitivamente sem pudor. Deadpool dá certo porque ninguém tinha ousado antes a não se levar tão a sério assim — aliás, o longa de Tim Miller leva tudo na brincadeira e gozação. Fica aí a dica pra Marvel, Fox (deem uma pausa com tanto apocalipse na franquia X-Men, por favor) e especialmente a DC nos próximos anos.
11. Carol
Direção: Todd Haynes
Elenco: Cate Blanchett, Rooney Mara, Sarah Paulson, Kyle Chandler, Cory Michael Smith
Um ano após sair de mãos vazias do Oscar, Carol ainda parece bom demais para aquela premiação, marcada pela falta alarmante de diversidade. É um filme composto com tanto cuidado pelo diretor Todd Haynes que se você piscar é capaz de perder algumas das tomadas mais bonitas dos últimos anos, do granulado do filme 16 mm à paleta de cores chapadas, quase uma relíquia do cinema da década de 50, época em que se passa. Adaptado do romance The Price of Salt, escrito por Patricia Highsmith, Carol acompanha a história de amor entre Carol Aird (Cate Blanchett), membro da elite nova-iorquina, e Theresa Belivet (Rooney Mara), uma tímida aspirante à fotografa. Como Haynes faz disso um tema é um dos principais destaques da obra: enquanto Therese observa Carol pela lente de sua câmera, nós as observamos – espiamos – através de janelas, vidraças, espelhos, quase nunca diretamente, a não ser em momentos chaves, nos quais a escolha ganha uma força extraordinária. Carol é sobre o toque, e como ele pode durar mesmo quando a mão não está mais lá, é sobre o olhar e como às vezes ele é o suficiente para comunicar uma mensagem, é também sobre como era ser gay nos anos 50, mas é surpreendentemente um filme necessário para o agora.
10. Zootopia
Direção: Byron Howard, Rich Moore, Jared Bush
Elenco: Ginnifer Goodwin, Jason Bateman, Idris Elba, Jenny Slate, Nate Torrent, Bonnie Hunt, J.K. Simmons, Octavia Spencer, Alan Tudyk
A Disney vem acertando a mão desde que John Lasseter assumiu a direção do departamento de animação do estúdio — desde Enrolados, mais especificamente. Porém, ainda não havia tido um acerto como Zootopia (desculpe, fãs de Frozen). O longa tinha potencial para ser apenas fofo, mas provou ser um dos mais inteligentes, sagazes, divertidos e, sim, fofos do estúdio. A película tem êxito em recriar o mundo que conhecemos para uma realidade adaptada para os mais diferentes animais. Essas adaptações dão oportunidade para a criação de situações cômicas perfeitas e um visual incrível. Sobram também referências cinematográficas e de séries (O Poderoso Chefão e Breaking Bad, só para começar). Porém, o mais importante de Zootopia é manter a essência do mundo real e abordar os preconceitos de gênero, raça e sexo, com humor e sutilidade, mas o suficiente para deixar lições para os mais novos e fazer os adultos refletirem sobre respeitar as diferenças.
9. A Grande Aposta (The Big Short)
Direção: Adam McKay
Elenco: Christian Bale, Steve Carell, Ryan Gosling, Brad Pitt
Comédias não costumam fazer sucesso com o pessoal da Academia — talvez por isso, apesar de vencer o prêmio do Sindicato dos Produtores no ano passado, a conquista não foi o bastante para A Grande Aposta conquistar o Oscar de melhor filme. O longa-metragem parte de uma premissa séria e dolorosa pra muitos estadunidenses: a crise econômica de 2008 a partir da bolha do mercado imobiliário nos Estados Unidos. A trama é dividida em vários núcleos para tentar explicar como é que um colapso econômico desses acontece sem ninguém sequer ter notado. Não é um assunto fácil, e certamente nem uma palestra de duas horas da Miriam Leitão seria o suficiente para explicar aos leigos o que aconteceu, como e por quê. Apesar disso, o diretor/roteirista Adam McKay (o mesmo de O Âncora e Quase Irmãos) monta uma película que insere piadas em lugares inimagináveis, preferindo rir da tragédia ao invés de chorar com ela. O longa é cheio de sarcasmo, dispõe de uma edição refinada, constantemente quebra a quarta parede, seja para brilhantemente explicar termos e conceitos técnicos (normalmente feitos para enganar as pessoas) com Margot Robbie na banheira ou Selena Gomez jogando num cassino, ou para dizer que tal cena não aconteceu realmente daquele jeito na vida real porém era mais conveniente pôr a cena daquela maneira já que facilita na condução do filme. Além disso, conta com atuações de alto nível de Steve Carell, Christian Bale e Ryan Gosling.
8. Os Oito Odiados (The Hateful Eight)
Direção: Quentin Tarantino
Elenco: Samuel L. Jackson, Kurt Russell, Jennifer Jason Leigh, Walton Goggins, Demián Bichir, Tim Roth, Michael Madsen, Bruce Dern, Channing Tatum
Um roteiro vazado, alguns informantes processados, uma dramatização escalada com os atores e diversas entrevistas depois, Quentin Tarantino enfim realizou seu oitavo filme. Há tudo o que estamos acostumados presente nele provenientes do estilo tarantinesco: diálogos ácidos e prolongados, trilha sonora escolhida a dedo e, claro, violência; muito sangue jorrando, muita porrada, muitos tiros. De quebra, também há a volta da manipulação no tempo da narrativa, e uma metalinguagem temperada aqui e ali. Pode não bater de frente com a carta de amor ao cinema que é Bastardos Inglórios, mas cumpre seu papel como filme digno de uma carreira impecável até agora.
7. Spotlight – Segredos Revelados (Spotlight)
Direção: Tom McCarthy
Elenco: Mark Ruffalo, Michael Keaton, Rachel McAdams, Liev Schreiber, John Slattery, Brian D’Arcy James, Stanley Tucci
Diferente de O Regresso, seu principal concorrente no Oscar, Spotlight deixa de lado o impacto visual para se concentrar no que tem de melhor: sua história. Não tem como assistir ao longa e não sentir um embrulho no estômago por saber dos detalhes lamentáveis dos crimes cometidos por padres, não só nos Estados Unidos como no mundo todo. Spotlight também serve como aquele exemplo, que aparece de tempos em tempos, para mostrar como o jornalismo é importante para a sociedade. No cenário atual onde o presidente dos EUA e sua equipe mentem descaradamente — e têm a pachorra de chamar isso de “fatos alternativos” — , sem contar a enxurrada de notícias falsas ou com fatos distorcidos ao redor do planeta, incluindo no Brasil, o jornalismo se faz necessário e Spotlight soa ainda mais atual do que quando foi lançado.
6. A 13ª Emenda (13th)
Direção: Ava DuVernay
5. Creed: Nascido Para Lutar (Creed)
Direção: Ryan Coogler
Elenco: Michael B. Jordan, Sylvester Stallone, Tessa Thompson
Hollywood é um ecossistema bem peculiar. Desde o seu nascer, a mesma foi de pontos maravilhosos de pura criatividade, caminhando até períodos em que que nada soava como original — muito menos interessante. Creed não é um filme original — inclusive, é continuação da icônica franquia Rocky — e sua proposta não consegue chamar atenção do espectador purista, porém isso não é um demérito do filme. O problema é relacionado ao método de produção agressivo de Hollywood em lotar salas de cinema com continuações, spin-offs e outros tipos de derivados de franquias já estimadas pelo público. Nesse cenário desfavorável, Creed é uma surpresa agradável. A obra funciona de forma competente ao alternar momentos de homenagem para a franquia Rocky, e renova-se nos recursos de linguagem — e temática — para alcançar a comunicação com o público mais jovem. Sylvester Stallone é tão íntimo ao personagem Rocky Balboa que nem uma atitude do mesmo soa inverossímil, tudo é coeso e lógico. Michael B. Jordan brilha em apresentar ao mundo o filho do lendário Apollo Creed, trabalhando muito bem com as nuances do personagem. Creed é uma surpresa agradável no meio de um cenário abusivo de produção, e é possivelmente um dos melhores filmes da franquia já consolidada. É otimista pensar que uma obra sobre legado se consolida como um exemplo disso para o próprio universo cinematográfico em que habita.
4. A Bruxa (The Witch)
Direção: Robert Eggers
Elenco: Anya Taylor-Joy, Ralph Ineson, Kate Dickie, Harvey Scrimshaw, Ellie Grainger, Lucas Dawnson, Julian Richings
Com todo o burburinho que tomou a internet enquanto divulgava seu filme em festivais e círculos de exibição fechados, o roteirista e diretor Robert Eggers pôde se estabelecer já como um grande nome do terror atual. Diferenciando-se das centenas de títulos que vão do já desgastado found footage aos sustos gratuitos para fazer o espectador pular na poltrona do cinema, A Bruxa prefere investir em um clima de suspense e interminável tensão, desfilando imagens que nos atraem por sua beleza e tratamento estético, ao mesmo tempo que nos assusta por seu poder sombrio. Além disso, a trilha sonora, repleta de cordas que parecem gritar e corais fantasmagóricos, completam o clima sufocante da projeção, aliada às atuações assustadoramente boas de atores novatos da grande tela, como a protagonista Anya Taylor-Joy.
3. A Chegada (Arrival)
Direção: Denis Villenueve
Elenco: Amy Adams, Jeremy Renner, Forest Whitaker
Chegando tímido, como uma ficção científica despretensiosa, A Chegada acabou surgindo como um dos melhores filmes de 2016. Ele cria sua atmosfera particular e cria conceitos específicos, mostrando a pegada do autor aqui. O longa trabalha com uma linguagem científica que é refinada, mas clara o suficiente para os espectadores não ficarem em dúvida — em suma, não é mastigadinho e também não subestima a inteligência de quem assiste. Mas o poder de A Chegada está no subtexto. É uma experiência emocional belíssima, que depende totalmente do talento de Amy Adams, que carrega (no bom sentido) o filme nas costas. Sem ela, A Chegada não teria o mesmo impacto — e até por isso houve tantas reclamações sobre a ausência da atriz na lista do Oscar de 2017. Além da pungente jornada da protagonista, a película trabalha bastante com o poder da linguagem e procurar entender o que o outro deseja. No filme, alienígenas se instalam em todo o planeta, mas qual é o motivo disso? Se a intenção era fazer um paralelo com a situação atual no mundo, onde o conservadorismo vem forçando os países a fecharem suas fronteiras e pensarem unicamente no seu terreno, demonstrando desinteresse no sofrimento e necessidade dos outros, Villeneuve fez um trabalho de mestre. Quando o desconhecido bate à porta, a reação é achar que o visitante está ali apenas para criar a guerra, tomar o que é seu. É o pré-conceito, muitas vezes errôneo, baseado no medo. O diálogo é peça chave para tudo o que nos envolve e A Chegada exibe a importância disso. Quanto mais prestar atenção em A Chegada, mais você irá extrair do filme. É um daqueles exemplos em que se une entretenimento de qualidade, qualidade técnica impecável e um profundo debate sociológico/filosófico.
2. Elle
Direção: Paul Verhoeven
Elenco: Isabelle Huppert, Laurent Lafitte, Anne Consigny, Charles Berling, Virginie Efira
Elle não é um filme fácil de digerir. Ele causa sensações das mais diversas, e o desconforto é a principal, que segue o espectador durante as duas horas de exibição. O plot parte do estupro sofrido por Elle (Isabelle Huppert) em sua casa. Após a violência sexual, ela tenta lidar do seu modo com a agressão e busca descobrir qual dos homens em sua vida seria capaz de cometer tal ato. A forma com que a protagonista lida com a situação não é a mais convencional, e não dá pra saber como algumas pessoas enxergarão essa escolha. Ao seu redor, há pessoas mais problemáticas do que ela própria, apesar do que sofreu. Em meio a tanto descontrole e escolhas duvidosas, Elle decide não ser a vítima e decide tomar o controle da situação. Misturando humor negro e sarcasmo com elegância, junto com sátira social, abrindo oportunidade para situações bizarras e catatônicas, Elle serve de ode para o cinema sensual e perturbador de Cronenberg e DePalma, além de gerar discussões. O filme surpreende a cada cena, parte pela direção precisa de Paul Verhoeven e parte pela atuação espetacular de Huppert, que carrega consigo um equilíbrio entre a seriedade, a sensualidade e o deboche, ou seja, o necessário para não transformar o longa em um exemplo de sexploitation e mau gosto. A linha é tênue, mas Elle prova ser milimetricamente pensado para não passar do limite, provocando e desafiando o espectador do primeiro até o último minuto.
1. Aquarius
Direção: Kleber Mendonça Filho
Elenco: Sonia Braga, Humberto Carrão, Maeve Jinkings, Irandhir Santos
O diretor Kleber Mendonça Filho presenteou o cinema nacional com uma obra poética e tocante no ano de 2016. Kleber, que já havia atestado sua competência anteriormente em O Som ao Redor, retorna com uma estória extremamente intimista — apesar das consequências da mesma estarem elevadas em vários pontos de nosso cotidiano — sobre a importância das memórias afetivas em nossa vida.
Nossa vida é refletida em cada ponto que passamos, cada objeto — ou lugar — pode ser parte fundamental em alguma narrativa de nossas jornadas, mesmo não passando de um coadjuvante. No longa acompanhamos Clara — brilhantemente interpretada por Sônia Braga –, uma mulher de meia idade que virou alvo em uma sociedade que o novo perdeu a delicadeza em se relacionar com antigo. A obra beira a um estudo diplomático sobre a dicotomia antagônica da convivência do novo com o antigo, frisando que não há necessidade de renunciar um pela existência do outro.
Aquarius é uma peça necessária em nossa sociedade, principalmente em tempos extremamente densos no aspecto político nacional. Sem pudor ao exibir uma geração que acredita em que sucesso financeiro define também boa visibilidade social; uma geração que não hesita em criar insegurança para vender conforto, em impor falsas necessidades e tornar inevitável para a população não aderir a elas. Sendo impecável em todos aspectos técnicos, e com uma atuação fortíssima de Braga — a explosão de Clara no desfecho do filme é uma das cenas mais impactantes de 2016 — , o filme é um retrato delicado de Kleber Mendonça Filho sobre o período em que vivemos. O que deixa extremamente melancólico pensar que foi dispensado pelo Brasil na nomeação ao Oscar por mero cunho político, mas como citado anteriormente, são períodos densos.
Fizeram parte desta eleição:
Ewerton Mera, bacharel em Letras, mestre em Semiótica, professor de português e editor do blog Uma Estante.
Marcelo Hessel, jornalista, redator e crítico de cinema do site Omelete.
André Felipe Gevaerd Neves, produtor e diretor, diretor artístico do Festival Internacional de Cinema de Balneário Camboriú (CineramaBC).
Daniel Medeiros, crítico de cinema, editor e redator do blog 7Marte, pesquisador sobre cinema de terror e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine )
Roberto Sadovski, jornalista e crítico de cinema, escreve sobre cinema para o site UOL.
Ana Carolina Nicolau, editora do site Take 148.
Fellipe José Souza, colaborador do Previamente.
Rodrigo Ramos, jornalista, editor do site Previamente, repórter do Jornal O Navegantes.
Pedro Bughay, graduado em Realização Audiovisual e especial em Economia da Cultura, produtor, escritor e diretor.
Diego Benevides, jornalista, crítico de cinema, especialista em Cinema e Linguagem Audiovisual e em Assessoria de Comunicação, repórter do Jornal Diário do Nordeste, curador e produtor da Mostra Cultura de Cinema Brasileiro, presidente da Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine) e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine).
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