The Flight Attendant, Ted Lasso e PEN15 estão entre os destaques.
O Previamente, a partir de um júri com 22 pessoas entre profissionais da área, jornalistas, críticos, estudantes e aficionados por séries, elegeu as melhores atuações coadjuvantes da TV na temporada 2020/2021. A seleção foi realizada utilizando os mesmos critérios do Emmy Awards: entram as obras que debutaram sua temporada entre 1º de junho de 2020 até 31 de maio de 2021, tendo sido exibida pelo menos 50% de seus episódios até o final de junho deste ano.
Confira a lista completa abaixo.
MELHORES SÉRIES (COMÉDIA)
Mythic Quest (Apple TV+) — Segunda Temporada
Nós precisávamos de uma boa série que se passa dentro de um ambiente de trabalho. Com Superstore despedindo-se neste ano, o público necessitava de uma substituta. E Mythic Quest vem para assumir o posto, com muito louvor. Se a primeira temporada já dava vislumbres do que poderia ser, a segunda consolida a série como uma das melhores comédias da atualidade. Cheia de personagens irritantes (porém, carismáticos) e com deliciosos desvios de caráter, o segundo ano investe nas histórias individuais, enquanto no fundo discorre o plot principal, que acaba não sendo tão relevante quanto as interações no dia a dia deles. De um modo distorcido, a série consegue nos fazer simpatizar até com um homem branco idoso misógino. Uma das coisas bacanas da série é justamente subverter arquétipos. Outro exemplo disso é colocar uma mulher na posição de chefe insuportável e abusiva com seus funcionários, no mesmo nível do seu colega masculino. O egocentrismo é central na série, que mostra que mesmo os narcisistas possuem sentimentos — inclusive, parte do comportamento torto deles origina-se de um local de dor. Profundo, né? Por fim, o melhor elogio que posso fazer à série é dizer que ela me recorda de alguns dos momentos mais brilhantes de Community. Portanto, assistam. — Rodrigo Ramos
The Flight Attendant (HBO Max) — Primeira Temporada
Se você se surpreendeu ao saber que Kaley Cuoco é, na verdade, uma ótima atriz, saiba que não foi o único. Após sua saída de The Big Bang Theory, que certamente lhe garantiu o financiamento para a sua aposentadoria no futuro, ela mostrou-se interessada em projetos mais audaciosos e que edificassem sua carreira. Além de fazer um trabalho excepcional de dublagem em Harley Quinn, Cuoco prova que é talentosa de corpo inteiro em The Flight Attendant, um suspense cômico que bebe um pouco da fonte de Killing Eve e prova-se superior até mesmo do que as temporadas 2 e 3 da sua referência. A chave aqui é saber manter o mistério vivo, mas sem que isso se torne o único atrativo da produção. No meio dessa comédia de erros, com personagens excêntricos e cativantes, a produção também consegue trabalhar com temas mais densos, o que até a deixa num limbo sem definição ao certo de qual gênero pertence (está listado aqui como comédia porque é o que a própria série diz ser, e nós aqui respeitamos a identificação de gênero dos outros). Honestamente, não estou muito confiante que teremos uma segunda temporada no mesmo nível da primeira, entretanto, aceito ser provado do contrário. — Rodrigo Ramos
Search Party (HBO Max) — Terceira e Quarta Temporadas
Com duas temporadas lançadas neste período de elegibilidade, Search Party é obrigação em qualquer lista das melhores comédias da atualidade. A série satiriza a geração dos millennials abusando do nonsense e do exagero para criticar de maneira ácida os jovens adultos de classe média e alta. Num momento em que a realidade flerta tanto com o absurdo, Seach Party consegue entregar o seu melhor, principalmente em sua terceira temporada. O julgamento de Dory Sief e Drew Gardner trouxe os momentos mais surtados e hilários dos últimos anos, a começar pela inusitada advogada de defesa vivida por Shalita Grant. Entretanto, por mais que a série proponha muitas situações inusitadas, o roteiro entrega personagens extremamente reais, cheios de hipocrisia, contradições, narcisismo e egoísmo. É preciso destacar o elenco que compõe tão bem este grupo de hipsters, desde Alia Shawkat e John Paul Reynolds, até os coadjuvantes que muitas vezes roubam a cena, Meredith Hagner e John Early. Por mais que a quarta temporada não tenha sido capaz de manter o altíssimo nível da temporada anterior, é inegável que Search Party é uma das melhores comédias no ar e divertiu bastante o seu público com inusitadas perseguições de carro, flashmobs, sequestros, casamentos, assassinatos e reviravoltas. — Diogo Pacheco
Superstore (NBC) — Sexta Temporada
Superstore acaba como começa: uma sitcom de riso rasgado que aproveita absolutamente todas as oportunidades para criticar duramente o grande capital. Nessa que é uma das melhores comédias contemporâneas, humor e política se misturam sempre, e a série esteve aí durante seis anos provando que sitcom é sim lugar de críticas e reflexões, e que é possível fazer rir com “assuntos sérios” sem perder a leveza. E estou falando de rir de gargalhar, tipo quando a Cheyenne fica nervosa.
Depois de uma quinta temporada irregular, o anúncio de que a sexta temporada seria a última não poderia ter vindo em melhor hora, embora certamente precipitado pela pandemia e pela saída de America Ferrera (a protagonista Amy Sosa) da série. Ainda assim, isso deu à sitcom – que já exibia os primeiros sinais de desgaste e enrolação por falta de um fim à vista – a chance de fechar com chave de ouro e traçar um rumo certeiro até a series finale.
A última temporada de Superstore, para mim, faz uma das melhores (e uma das poucas realmente boas) abordagens da pandemia. Com foco no tema central da série, a pandemia se torna terreno fértil para criticar duramente as grandes corporações, mais preocupadas em manter margens de lucro e proteger produtos, do que em zelar pela saúde dos funcionários. A sexta temporada navega com habilidade no limite entre não fingir que não há nada acontecendo, e não pesar demais uma série feita para fazer rir, espairecer e trazer conforto. E só deus sabe o quanto isso foi e continua sendo essencial na crise que estamos atravessando.
Os episódios dessa última temporada seguem a mesma lógica do restante da série: se fecham bastante em si, mas sem abandonar totalmente um arco narrativo. Só que dessa vez o arco aproveita construções plantadas ao longo da série inteira, não somente da temporada, evocando com desenvoltura uma sensação imediata de nostalgia. O mesmo acontece com o desenvolvimento (e desfecho) dos personagens: todos terminam na medida justa de seus desejos, personalidades e relações que vimos serem construídos ao longo de seis anos. O series finale é uma verdadeira ode à narrativa seriada. E, assim sendo, não tem como não emocionar e deixar saudades. — Luiza Conde
Master of None (Netflix) — Terceira Temporada
Master of None conquistou o público com suas diferentes qualidades desde sua temporada de estreia, especialmente com episódios focados em temas mais específicos, como “Parents”. Contudo, foi em sua segunda temporada que a série alçou voo completo nesse quesito, em episódios memoráveis como “New York, I Love You” e, obviamente, “Thanksgiving”. Depois de alguns anos sem qualquer esperança sobre seu futuro, fomos surpreendidos com o anúncio de uma terceira temporada focada na personagem de Lena Waithe, protagonista em “Thanksgiving”, e coescrita por ela e Aziz Ansari.
No contexto imposto pela pandemia, a influência parece se refletir não somente na produção da série, mas também em como ela funciona no todo. O clima intimista não é só nas restrições de segurança, mas na forma como o roteiro explora seus personagens. Assim, mesmo que nas temporadas anteriores houvesse um quê dramático, ainda havia humor suficiente pra se vender como comédia. Em “Moments in Love” acredito que seja difícil até vender a série como “dramédia”. Essa sendo a proposta, no entanto, não há nenhum problema. Inclusive, o único defeito em “Moments in Love” é a falta da presença de Angela Bassett, que podia ter aparecido pelo menos em uma videochamada para alegrar nossos corações. Uma pena que sua participação tenha sido reduzida a uma chamada telefônica relâmpago.
Em contrapartida, somos introduzidos à personagem de Naomie Ackie e, não somente no episódio focado nela, mas em toda a temporada, ela entrega uma das melhores atuações do ano. Sem dúvidas, é no quarto episódio que ela mais sobressai, num espectro de emoções que vão desde partir o coração a nos deixar com lágrimas de alegria. É ela sozinha quem sustenta o melhor episódio da temporada, em que a vulnerabilidade a qual a personagem é exposta é interpretada de maneira brilhante. É um episódio especial dentro de uma temporada (?) atípica, mas sua força é justamente pelo que se estabelece antes, numa exploração do romântico que faz jus ao que se espera de Master of None, não à toa uma disrupção no relacionamento das protagonistas começa quando o personagem de Aziz Ansari — sem respostas diretas sobre o fim da segunda temporada — entra em cena. Mas é em como estabelece seus personagens, seu discurso, sua reflexão, que torna o episódio protagonizado por Naomie Ackie numa força a ser reconhecida. E o episódio final vem para confirmar isso. “Moments in Love” é o amor em seu estado bruto. Ambíguo, contraditório, confuso, solitário, aconchegante, infindável, cansativo e uma outra infinidade de adjetivos. São momentos, e são para sempre. — Renan Santos
How To with John Wilson (HBO) — Primeira Temporada
John Wilson é um documentarista que coloca o seu olhar nas pequenas grandes coisas da vida e que movem as suas metrópoles e ruas. Ele estuda a cidade de Nova York para trazer os mais diferentes assuntos e temas dos mais banais, esquisitos, inusitados e a participação disso em vidas cotidianas e no cotidiano urbano, passando pelos mais diferentes tons, e domina completamente diferentes abordagens de como se lidar com esses assuntos e temas, examinando com uma câmera que é distante, mas apaixonada, que diz tudo com as suas tomadas e vai se revelando uma série cada vez mais surpreendente. — Diego Quaglia
Dickinson (Apple TV+) — Segunda Temporada
Dickinson é uma série livremente baseada na vida e na obra da poeta de mesmo nome. Hailee Steinfeld está cada vez mais confortável em um papel que parece ter sido escrito sob medida para ela, que é dona de um timing tragicômico perfeito para o tom que a série trouxe à memorável poeta. A série segue acertando muito bem no humor anacrônico baseado, em imprimir nos personagens do século XIX estereótipos atuais. Assim como em sua temporada inicial, aqui temos a faceta do realismo mágico, que confere um tom sombrio à série. Nesse sentido, surge o personagem Nobody, que vai acompanhar Emily em seus momentos de dúvida e medo em relação à sua carreira e fama. A busca pela fama, aliás, foi o tema central da série nesse ano e quem efetivamente auxilia Emily nessa jornada é Samuel Bowles, amigo de Sue, vivido por Finn Jones, uma grata adição ao elenco.
Além de tudo, Dickinson é ainda uma série de amadurecimento. Em seu segundo ano, vemos não apenas a nossa protagonista passando por esse processo, como também seus irmãos. Lavinia se torna uma das mais divertidas personagens e sua relação com Shipley rendeu algumas das cenas mais engraçadas da temporada. Enquanto Austin apresenta um grande crescimento à medida que busca dar sentido à sua vida em meio a crises existenciais, o desejo de construir uma família e o apoio à revolução ao lado de Henry. Isso tudo aliado a boas atuações, uma trilha sonora autêntica e um texto sagaz fazem de Dickinson uma das séries mais interessantes no ar. — Valeska Uchôa
PEN15 (Hulu) — Segunda Temporada
Pessoalmente, acho impressionante a maneira como se encerra a segunda temporada de PEN15, levando em conta como tudo tem início. Se no primeiro ano, mesmo com alguns pequenos deslizes, a série já figurava entre uma das melhores comédias da temporada, em seu reduzido retorno — infelizmente, são apenas sete episódios — a dupla de protagonistas volta não só com um texto muito mais afiado, mas com toda uma produção muito mais alinhada e que resulta diretamente em uma série de acertos que não a deixam decair em momento algum. O que quer dizer que o constrangimento em ver Maya Ishii-Peters e Anna Kone navegando pelo colegial é ainda maior. Porém, agora, o controle sobre tudo é tão grande que a maneira como a própria série navega com tanta fluidez pela comédia e mistura diversas referências e gêneros potencializa ainda mais o todo e funciona como a peça em que as melhores amigas protagonizam, cada uma à sua maneira, no final da temporada.
O ritmo é muito mais agradável neste segundo ano, o que só ressalta as inserções geniais de edição, pequenas anedotas e momentos cada vez mais lúdicos com vivências que são ou foram comuns a todos. Porque, no fundo, PEN15 fala sobre isso, esse processo de autoaceitação em um ambiente hostil e com hormônios à flor da pele onde imperam ingenuidade e ignorância. E aí vem o contraste com o fim da temporada, quando a vida dá uma rasteira em nossas personagens e o choque é um sentimento agridoce em meio ao momento de glória de Maya e Anna. Afinal, a vida toda é feita de ambientes hostis onde tropeçamos até, enfim, encontrar o jeito certo da coisa andar. Como o trio cocriador da série — Maya Erskine, Anna Konkle e Sam Zvibleman — fala sobre isso, mesclando vários temas difíceis em meio a tudo, é o que a torna tão especial.
Erskine e Konkle com certeza são o expoente disso. A maneira como se encaixam com o elenco mirim/juvenil/adolescente (como queira) é um trabalho por si só encantador. Contudo, é melhor ainda quando abre portas para discutir temas com a sensibilidade necessária sem abusar da infância/adolescência do restante do elenco e discutir diversos tabus que, com certeza, ecoam na cabeça de muita gente até hoje. É intrínseco ao que somos e ainda dá a liberdade, por exemplo, de vaginas animadas terem sua voz aos créditos finais. Ah, e o elenco jovem é excelente! É preciso ressaltar como o trabalho com eles é tão bem feito que torna tudo ali tão crível e constrangedoramente gostoso de acompanhar.
PEN15 é hilária, mas em seu segundo ano a série se define como uma das comédias mais relevantes em exibição, enquanto o talento ali permite ser algo muito além do que uma bem-vinda risada semanal. Erskine e Konkle são tão mágicas quanto suas personagens em cena e, em tempos tão sombrios, uma amizade como a das duas é mais que suficiente para alegrar e energizar qualquer coração. Só espero não me tornar uma Maura me sentindo tão próximo das duas depois de tudo que vivemos nessa segunda temporada… — Renan Santos
Ted Lasso (Apple TV+) — Primeira Temporada
Ted Lasso, com sua primeira temporada, se tornou o feel-good-show de 20-21. Os mais chatos dizem (com razão) que a série não tem nenhuma grande inovação estética ou narrativa. Que, apesar de engraçada, não tem piadas especialmente originais ou brilhantes. Mas é justamente essa familiaridade que torna a série tão querida. A costura feita por Bill Lawrence (um veteranaço da indústria, produzindo comédia com regularidade a um quarto de século) é rica justamente por trazer elementos tão básicos e comuns em tão alto nível. É uma metáfora do próprio personagem principal. Jason Sudeikis está irresistível, no papel de sua vida. Do tipo que nem precisamos ter visto os outros pra afirmar isso. — Juliano Cavalca
Hacks (HBO Max) — Primeira Temporada
Ser apaixonado por TV está ligado diretamente ao fato de que a gente sabe quando uma temporada anual foi fraca. Depois de um semestre morno como o segundo de 2020, a primeira metade de 2021 trouxe diversas surpresas boas e a maior delas, sem dúvidas, foi Hacks, da HBO Max. Com uma premissa simples e que faz referência a produções como O Diabo Veste Prada e Veep, a série narra as desventuras de uma dupla improvável: uma comediante decadente de Las Vegas e uma jovem roteirista fracassada. Deborah Vance e Ava Daniels se encontram no pior momento de suas vidas e vão aprender a se redescobrirem como mulheres independentes no mundo do showbiz.
Carregada por uma entrega primorosa das atrizes Jean Smart (uma veterana implacável) e Hannah Einbinder (o breakthrough role de 2021), Hacks é um sucesso em tudo o que se propõe. Com um texto ácido do trio de roteiristas da saudosa Broad City, a série traz aquele espírito das melhores dramédias da HBO, em que num minuto estamos rindo de uma piada escatológica com referências improváveis e no outro estamos aos prantos com uma reação emocionante de alguma das protagonistas. Genuinamente divertida, atual e magnética, Hacks é indispensável para qualquer fã de boa TV. — Zé Guilherme
Menções honrosas: WandaVision (Disney+), Girls5Eva (Peacock), Zoey’s Extraordinary Playlist (NBC), Mom (NBC) e Corporate (Comedy Central).
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Fizeram parte do júri
Angelo Bruno, estudante de Letras — Licenciatura em Português.
Breno Ribeiro, roteirista.
Caio Coletti, jornalista e repórter do site Omelete.
Carissa Vieira, roteirista, formada em Cinema e Audiovisual.
Cid Souza, criador e host do SeriousCast.
Diego Quaglia, cineasta, roteirista e crítico de cinema e audiovisual.
Diogo Pacheco, colaborador do Série Maníacos.
Eduardo Fernando Gomes Filho, colaborador do Cine Eterno.
Geovana Rodrigues, sommelier de séries.
Juliano Cavalca, bacharel em Economia, escreve sobre seriados na internet desde 2005.
Mariana Ramos, roteirista, mestre em Cinema e Audiovisual, host do podcast Isso não é um filme.
Mateus Santos, engenheiro mecânico, humildemente viciado em séries
Mikael Melo, jornalista, produtor de Jornalismo na NDTV Record.
Rafael Mattos, estudante de Jornalismo, administrador do grupo Crônicas de Séries.
Rafaela Fagundes, sommelier de séries.
Régis Regi, bacharel em Cinema, roteirista.
Renan Santos, formado em Cinema, crítico e newsposter no site Cine Eterno.
Rodrigo Ramos, jornalista, repórter/assessor de comunicação na Prefeitura de Navegantes, editor do site Previamente, foi programador de cinema na Cineramabc Arthouse.
Tammy Spinosa, host e editora do SeriousCast e quase geógrafa.
Thiago Silva, host e editor do SeriousCast e amante da TV.
Valeska Uchôa, cientista da computação, ex-colaboradora do Série Maníacos e do falecido Lizt Blog.
Zé Guilherme, farmacêutico, mestre em Ciências Fisiológicas, já colaborou nos sites LoGGado e Cine Alerta.
Textos por Diego Quaglia, Diogo Pacheco, Juliano Cavalca, Luiza Conde, Renan Santos, Rodrigo Ramos, Valeska Uchôa & Zé Guilherme
Produção, edição e redação final por Rodrigo Ramos