Com apenas 25 anos e cinco filmes no currículo, o cineasta já possui o respeito da crítica e sete prêmios no prestigiado Festival de Cannes
Ninguém pode dizer que viu um filme de Xavier Dolan e não sentiu nada. Alguns odeiam. Outros se impressionam e há ainda os que nunca mais querem saber de outro diretor. Aos 25 anos, o canadense Xavier Dolan já tem sob sua direção 5 longas premiados mundialmente: Eu Matei Minha Mãe (2009), Amores Imaginários (2010), Laurence Anyways (2012), Tom na Fazenda (2013) e Mommy (2014).
A ousadia e a arte se destacam nos filmes no diretor canadense, que vem conquistando prêmios em Cannes e em outros festivais internacionais a cada nova produção. Em 2015, ele foi um dos jurados do festival francês, tornando-se um dos mais jovens diretores a fazer parte da bancada do júri de Cannes. O segredo do sucesso? Uma fórmula simples que o diretor defende sempre que questionado sobre as abordagens polêmicas em seus filmes: “Você tem o direito de fazer o que quiser em um filme”. E é isso que Dolan faz.
Eu Matei Minha Mãe, primeiro filme do diretor, traz um relacionamento conturbado entre uma mãe e seu filho gay adolescente vivendo sob o choque das gerações e colocando de forma crua a distância que existe muitas vezes entre pais e filhos. A história não poderia ser mais familiar para Dolan, já que é quase um filme autobiográfico, como muitos críticos apontam. O papel da mãe (e, por que não, da mulher) é um dos temas que Dolan explora com mais afinidade em seus filmes. Começando levemente em Eu Matei Minha Mãe, e chegando a um novo patamar de abordagens do tipo com Mommy. Logo, não demorou para que, assim que Eu Matei Minha Mãe ganhou três prêmios no Festival de Cannes de 2009, a crítica começasse a apontar o diretor como alguém envolvido em “terapia através da produção cinematográfica”, já que Dolan sempre afirmou que suas experiências pessoais estavam retratadas abertamente no longa.
Se a temática feminista causou impacto para o primeiro filme de Dolan, a homossexualidade não ficaria de fora das tentativas do diretor de fazer filmes fora do padrão hollywoodiano. Homossexual assumido, Dolan parte para seu segundo filme com uma leveza quase lírica, ao explorar um triângulo amoroso incompatível em Amores Imaginários. O longa, aguardado com antecipação pelo público após o sucesso de Eu Matei Minha Mãe, chegou com uma história que não causaria o espanto do primeiro filme do diretor, mas que revelaria muito mais de seus atributos na direção do que a produção anterior produziu.
Também vencedor de Cannes, Amores Imaginários pode ser definido como uma obra de arte em que cores e cenários entram em harmonia com os sentimentos dos personagens, enquanto estes lutam para compreender as intrínsecas relações entre o amor, o respeito e a amizade. Dolan explora cenas inteiras em tons de azul. Partindo para o amarelo, o verde e o vermelho em uma transição quase minimalista que acalma o espectador enquanto este se identifica com a história. Afinal, o diretor mais uma vez explora experiências tão pessoais que todo mundo que já viveu um triângulo amoroso vai ver sua história ali contada e se identificar, tamanha naturalidade com a qual o enredo se desenrola. Do cômico ao triste fim de relacionamentos e amizades, Amores Imaginários tem um pouco de cada um de nós em cena, com um tom artístico que dá o charme canadense à película.
Sabendo que poderia pisar em terrenos desconhecidos com a segurança de um diretor renomado, Xavier Dolan volta ao drama e aborda em seu terceiro filme, Laurence Anyways, a vida de um transexual lutando pela aceitação da sociedade, da família, e vivendo uma relação de amor e ódio com sua parceira. Mais um polêmico e vencedor de Cannes, Laurence Anyways trouxe ao diretor mais respostas negativas da crítica, o que parece instigar ainda mais seus planos e sua independência na direção. “Eu leio todas as críticas. Há tanta coisa que falam sobre mim, tanta coisa desinteressante com suposições sobre quem as pessoas acham que eu era e quem eu sou… e isso não me interessa. Isso não é ser crítico, isso é diagnóstico, e eu não preciso de um psiquiatra”, aponta Dolan em uma de suas entrevistas.
Em 2013, Tom na Fazenda chega aos cinemas e, se até agora Dolan tratava de amores impossíveis e questões de gênero com maestria, o diretor resolve apostar em um suspense maduro sobre os mecanismos íntimos da perda e a profundidade das relações como um todo, não apenas amorosas. “Eu quis contar a psicose de vários seres humanos que desejam acalmar sua dor”, resumiu o cineasta em entrevista ao ser questionado sobre a necessidade de transformar sua primeira história em um suspense psicológico. O filme, que conta ainda com a elegante atuação da atriz canadense Evelyne Brochu (a Delphine, de Orphan Black), foi o único do diretor a não ganhar nenhum prêmio em Cannes, porém, conquistou o público no Festival de Veneza de 2013. O filme é baseado na peça homônima de Michel Marc Bouchard e tem como protagonista um personagem homossexual que perde seu parceiro em um acidente e vai atrás da família do rapaz para lidar com o longo processo de perda e aceitação.
Talvez por ser o mais recente, ou o mais premiado, é Mommy o grande triunfo de Xavier Dolan, que resgata o drama entre mãe e filho do seu primeiro filme, une a brilhante atuação de Suzanne Clément, sua parceira em Laurence Anyways, e cria um mundo emocionante e encantador aos olhos como até então só se via em Amores Imaginários. Mommy absorve todas as qualidades do diretor e apresenta a mais sólida, profunda e complexa história já contada por Dolan. Com enquadramento fechado proposital em grande parte do filme (que depois revela uma das cenas mais geniais do cineasta envolvendo uma sequência que acontece ao som do hit do Oasis, “Wonderwall”), atuações impecáveis, uma fotografia marcante e cenas construídas para emocionar e surpreender, Mommy levou o diretor canadense a um patamar quase inalcançável no cinema estrangeiro em 2014. O longa tem um total de 45 premiações, entre elas Cannes, Vancouver e César, além de ter a maior ovação do público em Cannes 2014, sendo aplaudido efusivamente de pé por mais de dez minutos.
E para quem ainda não se surpreendeu com Xavier Dolan, vale apontar que ele não só dirige, mas também atua em todos os seus filmes, sendo protagonista em Eu Matei Minha Mãe, Amores Imaginários e Tom na Fazenda, e coadjuvante nos outros dois longas.
Entre seus trabalhos futuros está Juste La Fin Du Monde (“Apenas o Fim do Mundo”, em português), um projeto baseado na peça homônima de Jean-Luc Lagarce, que acompanha um escritor retornando à cidade em que nasceu para anunciar aos familiares distantes que vai morrer em breve. O longa terá no elenco Marion Cotillard (Dois Dias, Uma Noite), Vincent Cassel (Irreversível), Léa Seydoux (Azul é a Cor Mais Quente), Nathalie Baye (Laurence Anyways) e Gaspard Ulliel (Saint Laurent).
Além disso, em 2015, Dolan vai dirigir seu primeiro filme em língua inglesa, The Death and Life of John F. Donovan, no qual Kit Harington (Jon Snow da série Game of Thrones) interpretará um ator norte-americano de cinema em ascensão que se corresponde secretamente com um menino de 11 anos em Londres; e Jessica Chastain (O Ano Mais Violento) viverá uma editora de uma revista de fofocas que deseja arruinar a vida do ator ao fazer comentários maldosos sobre a troca de correspondências com o garoto. O elenco também tem Susan Sarandon (Os Últimos Passos de um Homem) e Kathy Bates (Louca Obsessão).
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