Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) | Review

Batman ou (A Eterna Batalha entre a Arte e o Comercial)

Birdman pôsterO show business de Hollywood é algo inescrupuloso e desgastante. Quando você é querido, como é Jennifer Lawrence nos últimos anos, tudo o que se toca vira ouro e tudo é sobre você. Da mesma maneira como uma pessoa é lembrada, ela pode ser esquecida facilmente e, por diversas vezes, os astros tentam provar para o público e para si próprios que possuem valor. Tem ator vencedor do Oscar hoje em dia que está sem ter onde cair morto. Há outros que ficam conhecidos só por um só personagem e passam o resto da carreira atrás de um papel que lhe conceda o status de estrela do momento.

Birdman traz como seu protagonista Riggan, que qualquer um sabe se tratar de um alter-ego de Michael Keaton, o interprete da personagem, apesar de ele negar isso em entrevistas. Está ali a carreira de Keaton, no seu ápice, nos tempos em que fora Batman nos cinemas. Desde então, nunca mais teve lugar no holofote e poucas vezes acertou em suas escolhas profissionais. Tudo isso desencadeado pela recusa de um terceiro filme do homem morcego. Se Riggan acredita que irá se redimir e provar ter talento atuando, produzindo, roteirizando e dirigindo uma peça na Broadway, Keaton deve crer que Birdman irá revitalizar sua carreira. É irônico, é metalinguístico.

Birdman wins PGA Awards 2015

Edward Norton também interpreta a si mesmo. Um ator substituto, veterano, do método, que o público tem simpatia, e nos bastidores tenta controlar o projeto que nem mesmo é dele. Naomi Watts, veja só, também tem um papel semelhante a sua persona. É uma atriz que leva muito a sério sua carreira e sua personagem na peça é seríssima e dramática, como grande parte de sua carreira – até a série animada BoJack Horseman tirou sarro desse fato, contando com a participação da própria Watts na dublagem. Mais metalinguagem.

Alejandro González Iñárritu utiliza Birdman como uma sátira, uma crítica aos padrões hollywoodianos em basicamente tudo. Ele pega as figuras existentes no mercado e as reúne, somando vários diálogos que escracham o meio. Iñárritu não está errado em alguns dos pontos explorados na narrativa. Hollywood não é para qualquer um e pode facilmente fazê-lo enlouquecer, como é o caso de Riggan, que fala sozinho e vê o Birdman em todos os lugares. As comparações entre Hollywood e a Broadway são justas. Mas o diretor soa um tanto hipócrita ao falar mal dos críticos, já que costumeiramente são estes que louvam suas obras, enquanto a bilheteria não é normalmente o seu forte. A representação da figura do crítico é mais caricata e forçada do que qualquer outro personagem, como se o profissional fosse realmente antiprofissional e capaz de decretar o fracasso de uma obra – o que a gente sabe que independe do crítico, já que a cada novo Transformers, Michael Bay faz mais e mais dinheiro.

Um fator que incomoda é insistir que o cinema pouco respira arte (artista mesmo é só na Broadway, aparentemente) e que os blockbusters são o câncer da indústria, como fica explícito na sequência em que Riggan sai voando pela cidade em meio a explosões, tiros e monstros gigantes. Não é bem assim. O gênero cinemão basicamente sustenta Hollywood – se os estúdios apostam em filmes menores, independentes, é porque existem os arrasa-quarteirões para bancar esses projetos, como é o caso de Birdman, que é da Fox Seachlight, uma divisão de filmes pequenos da Fox, detentora de franquias como X-Men e Planeta dos Macacos. Aliás, as duas são exemplos de que um blockbuster pode sim unir inteleto, músculos e efeitos especiais e ser bom. Exemplos ruins estão de todos os lados – os chamados “filmes de arte” também podem ser ruins. Por sinal, existem aos montes.

No entanto, é compreensível a admiração pelo longa, já que ele veio num momento em que Hollywood encontra-se em crise de criatividade, identidade e rentabilidade – 2014 foi o pior ano de público desde 1995 nos EUA. Por conta disso, a autocrítica à indústria cai tão bem e com isso o meio tem visto com bons olhos, porque de vez em quando é bom olhar-se no espelho e reconhecer o que há de errado. Birdman serve para isso, o que, todavia, não o caracteriza como genial. Ao final do longa, o ator se entrega por completo para ser finalmente amado. Quando ele consome sua loucura em busca dos aplausos, ele finalmente se torna independente, adorado pela crítica e pelo público. É a partir do momento em que ele demonstra não se importar mais com a indústria que ele prova estar mais depende do que nunca e, bem, literalmente bate as asas. É a superação, a jornada do herói, digna de Hollywood. Birdman, tão metalinguístico que é, acaba sendo nada mais além de mais um produto da indústria podre, fétida e gananciosa a que pertence.

Fotos: Fox Seachlight

Antes do fim: a edição é fantástica por usar bem a ilusão que é o cinema ao fazer um plano sequência eterno, o que na verdade é desnecessário e não acrescenta nada à trama, tampouco serve como charme. É irrelevante, quase tonteante e já fora feito previamente. Palmas para a trilha sonora com bateria, agoniante, do jeito certo, e um abraço caloroso em Michael Keaton, finalmente se entregando como ator após tantos anos (não o via tão bem desde Os Fantasmas Se Divertem, ou seja, há muito tempo).

Birdman or (The Unexpected Virtue of Ignorance)
EUA, 2014 – 119 min
Drama | Comédia

Direção:
Alejandro González Iñárritu
Roteiro:
Alejandro González Iñárritu, Nicolás Giacobone, Alexander Dinelaris Jr., Armando Bo
Elenco:
Michael Keaton, Zach Galifianakis, Edward Norton, Andrea Riseborough, Amy Ryan, Emma Stone, Naomi Watts

4 STARS

Por Rodrigo Ramos

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